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Quando não há um Lula

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14.12.2025

Há momentos na história política em que a disputa eleitoral deixa de ser apenas um confronto entre programas e passa a ser uma luta por sentido, por pertencimento, por amparo simbólico. É nesses momentos que se revela, com clareza quase brutal, o peso da ausência de uma liderança popular carismática. “Quando não há um Lula” não é apenas uma constatação sobre um nome próprio, mas sobre um tipo específico de liderança que faz falta quando a sociedade entra em estado de medo, frustração e desalento.

Lula não é apenas um político experiente, nem apenas um articulador habilidoso. Ele encarna uma biografia coletiva. Sua trajetória pessoal funciona como metáfora viva da mobilidade social possível, ainda que imperfeita, ainda que interrompida. Em sociedades profundamente desiguais, essa identificação não é um detalhe: é um eixo estruturante da confiança política. Quando existe alguém assim no campo progressista, a política não se limita a promessas futuras; ela se ancora em memórias concretas, em lembranças de tempos em que a vida pareceu menos áspera para os de baixo. Quando não há um Lula, essa ponte entre passado vivido e futuro desejado se rompe.

Nesses cenários, a esquerda costuma insistir na racionalidade do discurso, na correção técnica, na superioridade moral de suas propostas. Tudo isso é importante, mas insuficiente. A política, sobretudo em períodos de crise, não é movida prioritariamente pela razão, mas pelo medo e pela esperança. Quando a esperança não tem rosto, o medo encontra terreno livre. E o medo, historicamente, é o combustível mais eficiente das direitas autoritárias. Elas compreendem, talvez melhor do que seus adversários, que pessoas angustiadas não buscam projetos sofisticados, mas proteção simbólica, ainda que ilusória.

Quando não há um Lula, a esquerda fala, mas não é ouvida; argumenta, mas não mobiliza; governa, mas não cria vínculo. Falta-lhe alguém capaz de traduzir complexidades em linguagem afetiva, de falar de economia contando histórias, de falar de Estado como quem fala de cuidado, de dignidade, de mesa farta. Falta-lhe alguém que não pareça um gestor distante, mas um par, um igual, alguém que “sabe como é”. Sem isso, a política progressista passa a soar abstrata, mesmo quando correta.

A ausência de uma liderança carismática também produz outro efeito silencioso e corrosivo: a fragmentação. Sem um polo simbólico forte, as forças de esquerda se dividem em disputas internas, em guerras de pureza ideológica, em competições por pequenos espaços de poder. Cada grupo fala para o seu público, reforça suas próprias certezas e perde a capacidade de construir uma narrativa comum. Lula, com todos os seus limites e........

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