O Estado como arquiteto do caos: a crise da habitação
A crise da habitação é profunda, sentida nas grandes cidades e até nas regiões do interior, afetando jovens, famílias e investidores. Mas há um erro persistente quando se pretende identificar as suas causas: culpar o mercado quando, na verdade, este está impedido de funcionar corretamente. Em vez de remover obstáculos à construção, reabilitação e arrendamento, o Estado português optou por políticas que distorcem incentivos, travam o investimento e criam uma escassez artificial. Esta abordagem – ideológica, estatizante e ineficiente – não resolve a crise. Agrava-a.
Um dos erros mais nocivos da política de habitação em Portugal tem sido a imposição de limites artificiais às rendas sob o pretexto de promover a “acessibilidade”. O Programa de Arrendamento Acessível oferece benefícios fiscais a senhorios dispostos a praticar rendas inferiores aos valores de mercado; no entanto, os limites impostos para aceder ao programa – desajustados da realidade do custo de oportunidade – tornam-no pouco atrativo. Em Lisboa, por exemplo, desde 2019 foram celebrados menos de 2 000 contratos ao abrigo do programa, num universo de dezenas de milhares de habitações disponíveis. A maioria dos proprietários opta por manter-se fora do regime, preferindo outras formas de arrendamento mais rentáveis ou menos burocráticas.
A isto somou-se, em 2023, uma medida excecional do pacote “Mais Habitação”, que congelou a atualização anual de certas rendas em apenas 2%, apesar de a inflação real ter sido muito superior. A consequência foi uma redução da rentabilidade do arrendamento tradicional e, portanto, uma migração para o mercado do alojamento turístico (Airbnb) e para o arrendamento informal ou de curta duração, onde não se enfrentam restrições legais nem riscos acrescidos.
Segundo a Confidencial Imobiliário, o número de casas disponíveis para arrendar em Lisboa caiu 30% em 2023 face ao ano anterior. Ou seja, quanto mais o Estado tenta controlar os preços, menos casas há para arrendar — e mais se agrava o problema da habitação.
Outro fator estrutural da crise da habitação em Portugal é a extrema burocracia urbanística. Construir nova habitação, reabilitar edifícios ou até mudar o uso de um imóvel exige uma peregrinação legal e administrativa que afasta até investidores mais persistentes. O regime dos Planos Diretores Municipais – que tem como principal legislação a conhecida popularmente como “Lei dos Solos” – é rígido e está........
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