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O elogio possível

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26.04.2025

Nos finais da década de 60 realizou-se o filme As Sandálias do Pescador, protagonizado por Anthony Quinn, baseado num romance com o mesmo nome e escrito uns anos antes por Morris West. O romance nunca li, mas o filme vi várias vezes, ainda que já não recorde bem quando o vi pela última vez. Lembro-me também que o filme ganhou uma aura de premonitório com a eleição de João Paulo II, já que contava a história de um cardeal soviético fictício, Kiril Lakota (ainda que baseado noutro bispo Lakota que morreu no Gulag para onde foi enviado pelos bolcheviques) que é surpreendentemente eleito Papa em plena Guerra Fria. Não querendo retirar mérito a Morris, cujo argumento exigia a eleição de um bispo oriundo do Bloco de Leste para um cargo que há mais de quatro séculos vinha sendo exercido exclusivamente por italianos, a verdade é que essa é a única coincidência entre a personalidade de João Paulo II e o personagem que Anthony Quinn interpretou magistralmente uma década antes. Lakota era o ideal que muitos católicos ocidentais esperavam ansiosamente ver na Cadeira de Pedro nessa década de 60 do Vaticano II. Talvez não seja coincidência que esse estilo só tenha chegado com Francisco, o primeiro Papa eleito que não participou directamente no Concílio. Bernoglio pareceu-se muito mais a Kiril Lakota que os seus antecessores.

No filme, Lakota, mais tarde Papa Cirilo, era um peixe fora de água na cultura do Vaticano. Era um homem simples, com fortes alicerces teológicos que, paradoxalmente, o submergiam em dúvidas quando confrontado com a necessidade de agir. Isto porque, para ele, a necessidade de agir correctamente o fazia questionar permanentemente a validez da teologia recebida. Entendia que a Ética era, em primeiro lugar, a faculdade de actuar bem e só depois uma teoria que pode ser deduzida de princípios abstractos. Se a isto se acrescenta uma humildade e pobreza voluntária e quotidiana e a presunção aceite, plena e conscientemente, de que Deus o encarregou de uma missão que passa por melhorar a vida material e espiritual da humanidade temos, nada mais e nada menos, que o Papa Francisco. A única e grande diferença foi que Cirilo sofreu a iniquidade do Comunismo enquanto Francisco pareceu estar atraído por ele. Em sua defesa deve ser dito que a Ditadura que conheceu de perto foi a dos militares argentinos e que sempre desconfiou mais das bondades do socialismo real dos Kirchner do que confiou nas teóricas de Marx.

É fácil gostar de Francisco porque nada daquilo em que acreditava é verdadeiramente anticristão. Francisco acreditava que, como Cristo, vinha para salvar os pecadores e confortar os pobres, pelo que, quem o critica deveria sempre centrar-se sempre no como desempenhou a sua missão. E mesmo esse........

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