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Pequeno pantone da compaixão

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31.08.2025

As palavras que em grego nomeavam as cores são ainda hoje de dificílima tradução porque, na verdade, correspondem a gradações de luz: μέλας (mélas – negro) por exemplo, dizia-se de um corpo capaz de absorver todos os raios de luz que o atingem, sem reflectir algum que nos possa afectar a retina. Negro, portanto, não era a escuridão nem a ausência de luz, mas uma presença demasiado intensa. Por outras palavras, é por excesso, e não por falta de cor, que por vezes não conseguimos discernir nenhuma – paradoxal e ofuscante cegueira.

Disso percebia Muhammad Al-Gafequi: nascido na província de Córdova na primeira década do século XII, estudou medicina, especializou-se em oftalmologia na luminosa cidade andaluza e aprofundou os seus estudos em Bagdad. A sua fama cedo chegou a Toledo e a outras cidades cristãs, de onde lhe solicitavam por escrito, e por vezes por intermédio de esquemas, os óculos e as lentes necessárias aos olhos cansados dos tradutores e dos nobres que perdiam a visão em refregas ou quedas de cavalo. Interessava-se por astronomia, flores e belas mulheres. Era elegante, mas lacónico. Dedicou ao filho o seu Guia de Óptica e interveio activamente no cultivo e na aclimatação do jasmim que os seus amigos Ali Rasuli e Abd Malik al-Garnati tinham trazido de Isfahan para Espanha. Acreditava também que o perfume da flor era o melhor remédio para a melancolia, pois, ao mesmo tempo que ensinava desprendimentos e despedidas sem dor, inspirava belezas e amores brancos.

A correspondência entre Córdova e Toledo era irregular, mas permanente: percorria vales e olivais, colinas verdejantes e solos calcários, nos lombos de velhos asnos, tão valentes como os seus guias. Pediam-se fármacos como o açafrão e o cravo da Índia, utilizado como anestésico, juntamente com o láudano de Itália e o ópio da China, medicamentos........

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