A Teofania do Ressuscitado
Na antepenúltima crónica, referiu-se a aparente incoerência dos relatos evangélicos sobre a ressurreição de Jesus de Nazaré. Com efeito, embora essa verdade seja insistentemente afirmada, os testemunhos em que se apoia uma tal proclamação parecem carecer de valor, na medida em que, os mesmos que dão fé da ressurreição de Cristo são também os que não reconheceram imediatamente o ressuscitado. Assim sendo, poderiam levar a crer que a ressurreição não foi uma constatação empírica, mas uma elaboração intelectual, que teria valor doutrinal, mas não factual, nem científico. Ora, se assim fosse, a fé cristã ruiria pela sua base pois, como disse São Paulo aos coríntios, “se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé e permaneceis ainda nos vossos pecados”, porque se “temos esperança em Cristo apenas para esta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens” (1Cr 15, 17.19).
Da dificuldade dos discípulos em identificar Cristo ressuscitado deu também conta o Papa Bento XVI, aliás Joseph Ratzinger, no seu magistral Jesus de Nazaré: “Antes de mais impressiona o facto de os discípulos, num primeiro momento, não O reconhecerem. Acontece isto não só aos discípulos de Emaús, mas também a Maria de Magdala e depois uma vez mais junto do mar de Tiberíades: ‘Ao romper do dia, Jesus apresentou-se na margem, mas os discípulos não sabiam que era ele’ (Jo 21, 4).” É verdade que, graças à abundantíssima e inexplicável pesca, aqueles discípulos chegam à conclusão de que o seu interlocutor é Jesus, mas não por aquilo que vêem ou ouvem. Com efeito, não o reconheceram quando O viram na margem, nem quando O ouviram dizer para lançarem a rede para o lado direito da barca. Por isso, o seu conhecimento de que era Jesus não procedia dos seus sentidos, nem da sua razão humana, mas de uma graça interior que lhes tinha sido concedida e, em virtude da qual, podiam........
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