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Um manifesto por um novo paladar na era digital

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05.08.2025

Há um sentimento, único na nossa era, que se instala após um período de scrolling sem rumo. Trata-se de uma ressaca cognitiva, um estado de simultânea agitação e torpor, de sobre-estimulação, porém, de profunda desnutrição anímica. Emergimos do fulgor do ecrã não mais sábios, mas com um zumbido latente de ansiedade e a vaga sensação de termos sido espoliados. Tal sentimento não constitui uma falha pessoal, sintoma de uma vontade débil ou de indisciplina. É, antes, um traço inerente ao seu desígnio. E para que compreendamos o que sucede às nossas mentes, cumpre-nos primeiro atentar no que sucedeu à nossa comida.

Durante milénios, a crónica humana foi uma luta contra a escassez. A grande ameaça era a subnutrição. No espaço de uma única geração, forjámos um mundo de uma abundância espantosa. Ao fazê-lo, contudo, apenas trocámos um flagelo por outro. A moderna indústria alimentar, ao otimizar-se para o consumo em massa, fê-lo com sacrifício direto da nossa saúde. É um sistema de uma astúcia notável, desenhado para forjar alimentos irresistíveis ao paladar, manipulados com as proporções exatas de sal, açúcar e gordura, para ludibriar os nossos instintos de recompensa, iludir os sinais de satisfação do corpo e a compelir-nos a querer sempre mais.

A mesma grande reviravolta abateu-se agora sobre o nosso meio informacional. Vencemos a escassez de informação só para nos afundarmos numa torrente. Neste novo ecossistema, plataformas e criadores são cativos de uma luta desapiedada pelo bem mais escasso do século XXI: a atenção do homem. Todo o objetivo de nos tornar informados, sagazes ou sequer ligados uns aos outros foi submetido ao imperativo supremo: manter-nos a fazer scroll. O resultado é o conteúdo de digestão fácil: informação concebida para ser consumida sem dispêndio, para acender a chama da indignação, para acalentar os nossos preconceitos e para evocar reações viscerais que exijam uma resposta instantânea.

Este regime de conteúdo, orquestrado por algoritmos, engendra uma nova crise de saúde pública: a desnutrição cognitiva. Tal como um corpo nutrido de alimentos industriais pode estar, em simultâneo, sobrealimentado e subnutrido, também a mente que se empanturra de iscos para a indignação, teorias conspiratórias e redomas de conforto algorítmicas se torna intelectualmente enfezada e socialmente alienada. Fica repleta das calorias vãs do conteúdo que apenas valida as crenças existentes, mas privada das vitaminas e fibras essenciais — as perspetivas discordantes, os factos matizados e as realidades complexas — necessárias para alicerçar uma visão realista do mundo.

Um estudo de 2018 do MIT, publicado na........

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