Salvar os proprietários florestais; matá-los à fome depois
O incumbente Presidente da República, ao contrário da sua lamentável intervenção inicial aquando da chegada a Pedrógão Grande, em 2017, dizendo – quando se contavam já quase vinte mortos na estrada fatal – que fora feito “tudo o que era possível fazer”, parece mais cuidadoso nas declarações públicas que vem produzindo no decorrer dos fogos rurais que atualmente nos fustigam.
Pretende – e bem – corrigir a má imagem que neste tema particular deixou aos portugueses em geral e às “partes interessadas” da floresta, em particular.
Acontece que não é num ou dois meses (os políticos, especialmente os “não executivos”, não dispensam mais do que isso aos assuntos exteriores à sua profissão – quando a têm – aos temas que são obrigados a comentar) que é possível deixar mensagens coerentes e responsáveis, pese embora possam parecer “lógicas”.
Não pretendo deixar aqui bons conselhos nem análises científicas a propósito dos presentes fogos rurais – já que os florestais da Academia que têm aparecido nas TV’s têm tido sensatas, fundamentadas e notáveis intervenções que deveriam, aliás, ser ouvidas atentamente por quem governa – antes pretendo aproveitar a oportunidade temporal que constitui uma ida do Sr. Primeiro Ministro à Assembleia da República, para partilhar algumas reflexões sobre fortes comentários políticos que por aí andam a propósito dos fogos florestais:
— O Sr. Presidente da República, cavalgando a óbvia satisfação coletiva de não se terem registado (até agora) vítimas humanas no Mundo Rural, explica aos microfones que “considera boa opção de salvar pessoas em detrimento da área florestal”. Quem poderia dizer o contrário?
Alguém mais sensato e sabedor talvez fosse levado a pensar que a opção é, tem de ser, puramente falaciosa: Imaginemos o Concelho de Palmela sujeito a um vendaval de fogos que ameaçam a Pousada, bem preenchida por nacionais e turistas, e de igual forma a AutoEuropa, onde as pessoas teriam sido mandadas para casa.
Seria do bom senso o Governo e a Protecção Civil instruir os seus meios de combate para irem defender a Pousada e deixar arder a Fábrica?
Não se trata de encontrar o mal menor mas de assumir – antes do momento de perigo – que salvar a Pousada e a Fábrica tinham/têm igual prioridade. A Pousada precisaria de meios e técnicas de combate específicos para a defesa de pessoas e património construído e a Fábrica, de meios sofisticados e específicos para os fogos industriais.
A escolha do exemplo de Palmela e da AutoEuropa não foi inocente: talvez a larga maioria da população portuguesa não saiba que a maior papeleira nacional (e aqui uma necessária declaração de interesses: onde me reformei, em 2013) gera um Valor Acrescentado Nacional bem superior ao da AutoEuropa, (primeira empresa exportadora nacional). Enquanto que a primeira (terceira maior exportadora nacional) parte de uma pequena planta, produzida e plantada em Portugal por milhares de pequenos proprietários, que........
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