Moçambique: no limite do desespero
Há mais de quinhentos anos, em Lisboa, numas Cortes no tempo de Dom Manuel I, um procurador do povo terá dito ao Rei – “Não desespereis, Senhor, os homens já desesperados!”
Os já desesperados são aqueles que já não têm nada a perder. No tempo do Rei Venturoso, em Lisboa, os desesperados eram crentes e talvez não fossem assim tantos; por isso, para entrarem em formas superiores de luta, teriam primeiro de ultrapassar barreiras e interditos religiosos. Mesmo assim, ao procurador popular, com uma franqueza e uma liberdade que de certo surpreenderão os que acham que a liberdade e a História de Portugal começaram no 25 de Abril, pareceu-lhe prudente chamar a atenção do Rei para as consequências de abusar da paciência do povo.
O aviso do procurador manuelino continua útil e actual para as elites políticas, académicas, mediáticas e económicas que olham com perplexidade e incómodo o sucesso dos “populistas” na América e na Europa. Mas será ainda mais pertinente para os países onde a acumulação de vícios e erros da elite governante já levou o povo ao desespero.
Tem sido assim em muitos países africanos, que, a partir da independência, acolhida pelo povo como uma esperança de vida melhor, livre dos malefícios do colonialismo, viram a eternização de uma elite, de uma classe dirigente e dominante senhora do poder político e do poder económico, com modos de vida que, quando comparados com os do povo, atingem a vertigem do escândalo.
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Como patriota e nacionalista (para mim não são coisas diferentes), entendo os que, de olhos postos na criação dos seus Estados, lutaram, a partir dos anos 60, pela independência, arriscando a liberdade e a vida. E se, como português, os combati, sempre os percebi e respeitei, como percebo e........
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