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Espelho Meu, Algoritmo Meu: a educação no reino do reflexo

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17.09.2025

Mesmo em período de merecido ócio estival, quando a mente se divide entre o azul do Atlântico e o verde da serra, é impossível ignorar os murmúrios do progresso tecnológico. Estar de férias não implica desligar o olhar crítico; pelo contrário, o descanso devolve-nos uma lucidez quase irónica perante as mais recentes pérolas do mundo académico. A última, saída da cartola da venerável Grammarly, promete adivinhar a nota de um trabalho universitário e até simular os comentários que um professor poderia escrever. Um oráculo digital, capaz de traduzir em dígitos o que antes exigia experiência, intuição pedagógica e, digamos, algum humor humano.

É impossível não recordar a clássica indagação da madrasta dos contos de fadas: “Espelho meu, espelho meu, quem é mais bonita do que eu?” No novo conto digital, a pergunta adapta-se: “Grammarly meu, Grammarly meu, que milagre de nota me reservas tu?” E, como num reflexo imediato, o sistema responde: “És brilhante, vales 17 em 20 valores, segundo os critérios prováveis do teu professor.” Eis a educação transformada em desfile de vaidades digitais, com a aprendizagem reduzida a refém do capricho algorítmico.

Esta aplicação, ao permitir carregar um texto, a grelha de avaliação e até informações sobre o docente, inaugura um modelo pedagógico que pouco tem a ver com formação intelectual. O estudante já não procura compreender; limita-se a calibrar o texto até que o espelho digital lhe devolva a resposta desejada. Cada frase acrescentada ou retirada é apenas mais uma........

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