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Futuro e prospetiva: Dados para uma teoria crítica

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03.02.2025

1 A grande questão face ao futuro prende-se com a contextualização do futuro e a sua temporalização, em ordem a delimitar e a circunscrever, na medida do possível, o seu policy-framework, mas, também, as suas consequências secundárias não intencionais e, assim, escapar aos efeitos negativos do pós-estruturalismo. Vamos esperar pelo futuro ou vamos antecipá-lo na medida do possível?

Como já sabemos, os impactos globais das grandes transições não cabem dentro da estrutura orgânica e da diferenciação funcional adotadas pela democracia liberal representativa. No atual contexto, em que esta estrutura e diferenciação geram externalidades negativas crescentes e maior segregação dos interesses envolvidos, precisamos de usar em nosso benefício as tecnologias de informação e comunicação existentes e, por essa via, reconectar, agregar e associar esses interesses fragmentados, desta vez, organizados no seio de comunidades inteligentes através de redes e plataformas que, esperamos, nos conduzam até uma nova economia dos bens públicos e comuns.

Já sabemos, também, que o determinismo das tecnologias de informação e comunicação nos coloca perante uma espécie de bifurcação cujos efeitos disruptivos é preciso evitar a todo o custo. De um lado, o modelo de negócio digital e a especialização inteligente da economia dos bens privados, do outro, os modelos de digitalização e inteligência artificial das comunidades, redes e plataformas (CRP) que informam a economia dos bens comuns colaborativos (economia BCC) em formação. É preciso evitar e minimizar os custos desta bifurcação e procurar as interfaces e interconexões positivas entre as duas vias. É uma missão de que a política do futuro não pode prescindir, é a repolitização do futuro que está em aberto e em discussão.

Sabemos, igualmente, que é muito difícil representar o futuro positivamente, sem que a insegurança e a incerteza tomem conta do exercício de representação. A ideia de progresso já não convence e a de inovação assemelha-se, cada vez mais, a uma retórica narrativa acerca da inovação. De resto, a tirania do presente deixa pouco espaço para o futuro, privatizado pelo individualismo e o narcisismo de cada um, enquanto os grandes cenários são só grandes cenários para representações apologéticas e justificativas.

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Dito isto, estamos perante a principal propriedade do pós-estruturalismo, a saber, a distopia do tempo, se quisermos, a pluralidade da nossa arquitetura temporal e a heterocronia do futuro e, portanto, a necessidade imperiosa de ensaiar a repolitização e o policy-framework do futuro através do exercício da prospetiva. Se a heterocronia é caótica, a repolitização do futuro estará lá, em princípio, para criar estabilidade, verosimilhança, confiança, inteligibilidade, diálogo sério e sereno entre os parceiros que são os agentes principais e os representantes das duas vias anteriormente enunciadas.

Quando me refiro à distopia e heterocronia da nossa arquitetura temporal, já sabemos que existe um conflito e risco de colisão entre o tempo global e o tempo local, que o tempo institucional é demasiado rápido para alguns e demasiado lento para outros, que existe o tempo lento das constituições, o tempo moderado das legislaturas, o tempo curto da ação executiva, o tempo imediato da comunicação social. Já sabemos, também, que a ideia de progresso parece antiquada e que as ideias de causalidade e linearidade já não colhem como antigamente. Hoje, o tempo vertical do estado-silo perde importância, há, cada vez mais, uma pluralidade de tempos que precisam de ser articulados entre si, ou seja, a linha de comunicação da democracia representativa é, hoje, mais horizontal e circular do que vertical, apesar de todos os dias........

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