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Desindustrialização, visão geoestratégica de Trump

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25.04.2025

O Trumpismo tem razão noutros factos, corroborados por dados estatísticos e estudos económicos.

Primeiro, o mundo mudou radicalmente em 2012-14. Do ponto de vista geoestratégico, passou de uni a tripolar. E foi Trump o primeiro a reconhecer os problemas que esta nova ordem levantava para a segurança do Ocidente.

Segundo, os factos corroboram o problema levantado por Trump da acentuada desindustrialização dos EUA, e que é um fenómeno comum a todas as economias desenvolvidas e, em particular, aos países da OCDE. A China passou a ser a grande fábrica do mundo.

Terceiro, os factos também confirmam que o “choque da China” é provavelmente o maior fator de desindustrialização dos países desenvolvidos”, embora também tenham contribuído o progresso tecnológico mais acentuado na indústria e a maior procura de serviços.

Quarto, existe evidência que a desindustrialização e o “choque da China” afetaram de forma mais intensa um conjunto de municipalidades e Estados, do chamado Rust Belt, onde o desemprego e o bem-estar das populações se agravaram seriamente, não tendo havido mecanismos de compensação nem do mercado nem de apoio social para estas populações, que são uma parte importante do eleitorado de Trump.

Quinto, o problema principal de Trump é o impacto da desindustrialização na segurança. A produção de metais como o ferro e o aço, ou os semi-condutores, são essenciais para a produção de armamento. As tecnologias avançadas permitem manter a liderança militar. Os produtos farmacêuticos e agrícolas estão ligados à segurança humana e sanitária das populações. Estas questões levantam problemas da resiliência das cadeias de produção e do reshoring e near-shoring. Há também outros problemas como a proteção da Propriedade Intelectual e dos segredos industriais, bem como do Investimento Direto Estrangeiro e transferência de tecnologia, que estão intimamente ligados ao problema da segurança.

Sexto, o problema da desindustrialização e o desafio de segurança que coloca aos EUA é comum aos outros países da OCDE e, em particular, à UE, que nada ou pouco têm feito para o resolver. E falta uma aproximação coordenada de todos estes países a este problema.

Sétimo, quanto à defesa militar, não existe, segundo Trump, uma distribuição equitativa dos custos da defesa do Ocidente e, em particular, da NATO.

Vamos seguidamente analisar estes fatores e corroborar com dados estatísticos, sempre que possível.

Podemos afirmar que 2012-2014 marca o fim do mundo quasi-unipolar dominado geo-estrategicamente pelos EUA. Entramos numa era de confrontação tripolar, em que o Ocidente se confronta com a China, uma potência mundial em ascensão, e a Rússia, uma potência militar de dimensão económica regional. Esta nova realidade é fundamental para a compreensão das políticas iniciadas por Trump, tanto no primeiro mandato de 2017 a 2021, como no segundo, de 2025 a 2029. Foi, talvez, o Presidente Obama, que esteve no poder entre 2009 e 2017, quem não reagiu atempadamente a esta alteração de paradigma, enquanto George W. Bush esteve dominado pela guerra no Afeganistão. Na União Europeia, foram presidentes da Comissão José Manuel Barroso (2010-2014, segundo mandato), Jean-Claude Juncker (2015-2019), e Ângela Merkel dominava a política europeia, que mostrou sempre um certo apaziguamento em relação à Rússia, e uma atitude de relação comercial na relação com a China.

A Rússia desafia o Ocidente e a segurança da União Europeia

O período dos anos 1980 até à década de 2000 é muitas vezes caraterizado pelo hegemonismo económico e militar dos EUA, o que constituía um mundo unipolar. A desagregação da União Soviética no período Gorbachov-Yeltsin de 1985 a 1999 levou à eclosão da USSR. Durante este período o Ocidente lançou vários programas de ajuda e assistência técnica à Rússia para introdução de uma economia de mercado e democracia, que tiveram um impacto limitado. Mas o grande feito foi a integração dos países de Leste da Europa na UE, que levou a um dos maiores sucessos de expansão económica dos últimos 50 anos, e à introdução da democracia nestes países.

Mas a Rússia iria rapidamente tentar voltar a afirmar-se como potência militar regional, confrontando o Ocidente e ameaçando a UE, levantando o problema da segurança desta, até aí protegida pelo “escudo” da NATO. Foi com Putin, que assumiu o poder em 2000, que se verificou a recuperação económica, e recomeça a asserção da Rússia como potência militar-nuclear. Instaurou um regime político autoritário/ditadura e económico baseado numa oligarquia.

Profere em Munique, em fevereiro de 2007, um discurso que mostra um grau sério de beligerância contra o Ocidente, ao lamentar a expansão da NATO para os países do Leste da Europa. Em agosto de 2008 lança uma guerra contra a Geórgia, que se tentava aproximar da UE, ocupando uma parte do seu território. Em fevereiro de 2014 inicia uma guerra contra a Ucrânia, que também revelava aproximação à UE e, por revolta popular, expelido o governo pró-russo, tendo conquistado a Crimeia e ocupado alguns oblasts da parte oriental.

Finalmente, em fevereiro de 2022 lança uma invasão em larga escala contra a Ucrânia, que devido à forte resistência deste país e do apoio dos países da orla Ocidental, resultou até agora na expansão dos territórios ocupados a Leste. Estas ações levaram à entrada da Suécia e Finlândia para a NATO, e a sucessivas ameaças contra a Europa, incluindo a ameaça nuclear. Terminava, assim, a boa relação entre o Ocidente e a Rússia.

A China afirma-se como potência mundial

Com a ascensão de Deng Xiaoping ao poder em 1976 a China inicia um processo rápido e maciço de industrialização, que originou o “choque da China” que vamos estudar. A sua política de crescimento baseada na expansão das exportações, seguindo o sucesso dos Tigres Asiáticos, culminou na entrada na OMC em dezembro de 2001. Mas foi com Xi Jinping, que ascendeu a presidente em março de 2013, e que levou a China a expandir a sua política externa à escala global. A China é um país comunista, de partido único, mas com uma economia de mercado com um elevado setor estatal, e fortemente regulada pelo Partido Comunista Chinês.

Lançou a Belt and Road Initiative para investir em infraestruturas para construir rotas de comércio, apropriar-se de recursos naturais e estabelecer ligações comerciais (de dependência da dívida com estes investimentos) à escala mundial (investimento de 1 bilião de dólares). Ao mesmo tempo cria o Asian Infrastructure Investment Bank, com sede em Beijing, para rivalizar com o Banco Mundial. Com 84 membros, que inclui muitos países ocidentais, entre os quais Portugal, tem um capital de 95 mil milhões de dólares contra 285 mil milhões do Banco Mundial. Em 2016 forma-se uma organização entre os países emergentes BRICS, com a finalidade de defender os interesses destes países dentro das........

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