O que temos dentro da Caixa?
Comecemos por Pandora. No mito grego, a primeira mulher recebe uma caixa que não deve abrir; contudo, por curiosidade, fá-lo e com esse gesto liberta a dor, a doença e a discórdia no mundo. No fundo da caixa fica algo discreto e decisivo: a esperança. Esta pequena história acompanha-nos há milénios porque descreve a nossa condição: abrir para conhecer implica risco, mas também possibilidade. Cada avanço humano — tecnológico, científico, moral — foi sempre uma forma de “destapar” o desconhecido, com perdas e ganhos.
Outras caixas famosas surgem depois, com funções diferentes. A Arca da Aliança, por exemplo, não se abre para espalhar algo: guarda. É cofre do que é essencial, faz-se respeitar pela distância e pelo silêncio. Ao contrário de Pandora, o seu poder reside em preservar o conteúdo e lembrar que nem tudo deve ser exposto de imediato; há conhecimento que só floresce quando é cuidado com tempo, contexto e responsabilidade. Entre a caixa que abre e a caixa que resguarda, a humanidade aprende duas gramáticas complementares: a coragem de procurar e a prudência de proteger.
A ciência acrescenta novas imagens. A caixa de Schrödinger nasce na imaginação de um físico: um gato que está vivo e morto até que alguém olhe. A metáfora tornou-se clássica porque treina a nossa humildade perante a incerteza. Nem sempre há respostas prontas; por vezes, a realidade pede observação paciente, ensaio e dúvida honesta. A caixa aqui é um convite a habitar as zonas cinzentas sem nos precipitarmos para conclusões........
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