Da falência ideológica à razão política
“A dead thing can go with the stream, but only a living thing can go against it”
G.K. Chesterton, “The Everlasting Man” (1925)
Portugal, em linha com a generalidade dos países ocidentais, atravessa um tempo de anestesia ideológica. Por cá este sono é mais profundo: os partidos falam sozinhos, ocupando um palco vazio, enquanto a sociedade civil assiste, ora aos berros, ora em silêncio, ausente ou resignada. Os governos e os partidos, esses, mesmo os que se acreditam de vanguarda ou de rutura permanecem ancorados em doutrinas herdadas de um século XX que sendo cronologicamente próximo se tornou conceptualmente remoto. Nunca é demais recordar que as ideologias que estruturaram o debate político durante décadas, do socialismo ao liberalismo passando pela social-democracia ou pela democracia-cristã, emergiram como respostas a desafios históricos muito específicos. Os abalos provocados pelas revoluções industriais e os confrontos entre autoritarismo e democracia liberal tinham uma função: organizar o mundo económico, mitigar os conflitos de classe, disciplinar os apetites do poder. Dá-se a causalidade do mundo para o qual foram forjadas já praticamente não existir, que não por imposição artificial de estruturas estatais obsoletas.
A aceleração da globalização, a mobilidade de pessoas e capitais, a erosão das fronteiras culturais, o carácter transnacional dos problemas sociais, o crescimento assimétrico da população mundial, o colapso da distinção entre o público e o privado e, mais recentemente, a irrupção da inteligência artificial como nova força produtiva e cognitiva, criaram e continuarão a acentuar realidades radicalmente novas.........
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