Vida Justa
A habitação no nosso país atingiu um nível de emergência social e, em face disso, o que aconteceu em Talude Militar (Loures) evidencia já uma guerra nos “espaços cinzentos” (espaços de conflito entre a dignidade possível de uma casa e a ilegalidade da sua construção) que deve ser acautelada tendo em conta que haverá mais de 25 destes bairros na Área Metropolitana de Lisboa. Sabendo todos nós desta situação, a omissão de auxílio é já de si um crime e, por maioria de razão, para o poder autárquico e estatal pois o poder público dispõe de obrigação legal (constitucional ou estatutária) de atuar, e a sua inação coloca em risco direitos fundamentais. Estamos perante situações limite de “segurança humana” que evidenciam uma crise humanitária e tal requer soluções de emergência.
Insegurança humana, crise humanitária e decadência institucional
Depois de uma negligência sistémica de anos em relação à situação da habitação, e de uma violência estrutural que reproduziu desigualdades, a destruição das barracas do Talude Militar evidencia já a violência directa como forma de actuação. É a “segurança humana” que está em causa. Em defesa de uma pretensa dignidade destroem-se as casas possíveis e colocam-se as pessoas mais presas do medo e das necessidades do que antes. O Talude Militar representa uma violência estatal directa que criou uma crise humanitária local mas que é uma imagem de uma crise humanitária mais alargada.
Não interessa se seguimos a doutrina social da igreja, os direitos humanos, o socialismo, a reflexão humanista básica ou outra qualquer posição teórica ou filosófica: de uma forma ou doutra, a alternativa a um espaço habitado, de casas, (Ecumene) é simplesmente o caos. É por isso que em situações de crise, a Ajuda Humanitária tem como prioridades a alimentação/nutrição, o abrigo, cuidados de saúde, água e saneamento e educação em situação de emergência. O aumento brutal de pessoas sem abrigo (quer vivam na rua de facto, em tendas, barracas ou em situações de habitação indigna), uma crise habitacional profunda e persistente (com a pior relação entre rendimentos e preços de mercado de toda a OCDE), assim como um stress ou mesmo sobrecarga habitacional generalizada (agregados gastando mais de 30 ou 40% do rendimento disponível) deve activar a consciência de que estamos perante uma emergência social ou mesmo uma crise humanitária interna. Tal consciência é fundamental para ultrapassarmos os comentários mais ou menos conformistas ou mesmo ritualistas que discutem a oferta privada ou/e a oferta pública num tempo........
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