O sentido oculto de Gouveia e Melo
Na entrevista que deu há uns dias a Clara de Sousa, na SIC Notícias, Henrique Gouveia e Melo quis esclarecer o sentido político da sua candidatura. Infelizmente, os esclarecimentos não passaram de uma confusa recapitulação das confusões previamente apresentadas. Não seria a primeira vez que o candidato destituído de clareza, de coerência ou de orientação, acabasse por ser o vencedor. Se isso abona em favor do eleitorado português, é questão que adiarei para um generoso calendário. Agora o que importa é salientar o óbvio: os putativos precedentes históricos não serão certamente suficientes para dar a vitória a Gouveia e Melo no próximo 18 de Janeiro. A continuar assim, 2026 trar-lhe-á, sim, uma provável derrota. De resto, Gouveia e Melo confirmou involuntariamente nessa entrevista que a única garantia de uma vitória está exclusivamente na mediocridade dos seus adversários.
Na sua apresentação mais determinante – como interpreta Gouveia e Melo a função do Presidente da República e os seus poderes constitucionais –, o candidato revelou as fragilidades das suas pretensões. Na entrevista superiormente dirigida por Clara de Sousa, Gouveia e Melo veio com uma linha preparada. Ignorou a primeira pergunta para comunicá-la. A linha era simples. No fundo, o que o define é a ideia de que não é um candidato de “partido”, e que, correspondentemente, reprova as outras candidaturas já apresentadas por padecerem desse vício. A linha não é nova e não deixa de ser um modo mais ou menos atrapalhado de distinção relativamente ao resto.
O corolário de distinção resulta, porém, de uma interpretação constitucional duvidosa. De acordo com Gouveia e Melo, as candidaturas unipessoais não devem ter um cariz partidário porque se pretende que o Presidente da República seja um “árbitro” e um agente “independente” no sistema. Acrescenta que aqueles que se candidatam com o apoio de partidos estariam a sacrificar essa independência. Mas aqui mora uma problema sério de interpretação. O que torna os Presidentes da República “independentes” não é a militância nem a origem........
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