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Crónica de Verão (e algumas memórias)

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24.07.2025

1 O Benfica é um tema forte nesta casa e agora em pré-eleições, ainda mais. Este abrasivo Julho vive-se até como uma saison estival/eleitoral. Estamos de resto habituados, vivemos num carrossel eleitoral há um bom par de anos e ainda faltam duas chamadas políticas, mas o que me interessa aqui é o Benfica. Não para discorrer sobre candidatos a uma liderança urgente e urgentemente outra, ou a candidaturas que elevem mais alto o voo das águias mas para me rejubilar.

2 O caso é que com o correr das conversas caseiras aqui no oeste, veio naturalmente à tona do tema, a candidatura de Martim Borges Coutinho. Não por acaso. Martim é neto do melhor presidente que o Benfica conheceu até hoje, ama o Benfica, tem-no na pele e na alma, revê-se no avô, quer seguir-lhe a pisada e a obra. E a inspiração, a devoção, a dignidade.

Quando lhe chamaram “corajoso” num debate televisivo aqui há dias, substituiu o adjectivo por “convicto”. Deve ser verdade: conforme também contou, está “há treze anos a preparar a sua candidatura” cheio de “convicção”.

Mas – e isto agora já sou eu – também corajoso, sim, ao afirmar que “Luís Filipe Vieira não tinha condições para se candidatar”. Éticas, pelo menos, pode ser duvidoso que tenha.

Se porém ainda não conheço inteiramente bem o neto, nunca mais esqueci o avô, Borges Coutinho. Mas imaginar que esse grande cidadão e presidente maior poderia agora ou outro dia, quem sabe?, vir a ter um sucessor directo na presidência do “Glorioso”, muito me alegraria. São as boas voltas da vida. Venha ou não Martim Borges Coutinho a ganhar esta quase dramática eleição do Benfica em Outubro, começa a dar-se por ele: já impôs uma postura e uma compostura; introduziu qualidade numa eleição complexa, sinalizou um entendimento estruturado sobre o maior clube de futebol português.

3 O futebol deu-me forte e cedo e o Benfica também. O meu pai, como tantos da sua colheita, era do Belenenses. Muitos dos amigos da casa, do Sporting. Do Benfica falava-se pouco. Ignoro de onde me veio a inclinação e depois a inteira – intacta até hoje – fidelidade ao Benfica, até perceber que quando gostava do Benfica estava a gostar de Portugal.

“Ah o Benfica é como um porto, uma pertença, uma família, o sítio de onde se é” escrevi eu um dia em “A Bola”, em Fevereiro de 2004, comemorava-se então o primeiro centenário da fundação do clube. E foi uma honra, claro, o convite da “Bola” e o ter-me “paginado” na companhia de Manuel Alegre e Bagão Felix, dois benfiquistas “extras”.

No Benfica palpita Portugal inteiro, porque de algum modo o Benfica é Portugal: estão ambos reflectidos no espelho um do outro e basta estar num estádio quando jogam os encarnados, para perceber o que quero dizer.

Foi sempre, sempre o Benfica que encontrei nas minhas múltiplas idas às Áfricas, onde se fala português, quer antes, quer depois das independências. Benfica, segunda pátria.

A dada altura fiz-me sócia. Lembro-me das vezes em que ia da nossa antiga casa do Campo Grande — umas vezes a pé –, o coração em festa e os sentidos alerta, asfalto fora, até ao estádio. A quantos desafios não assisti “in loco”, boina encarnada e cachecol às riscas, numa militância veemente que me punha rouca? E depois veio a grande Catedral, a cuja inauguração naturalmente fui no dia 25 de Outubro de 2003. A verdade é que me irmanava com os encarnados naquela espécie de energia privada de que o Benfica tinha o segredo e (quase…)sempre o exclusivo nos relvados.

Guardo religiosamente fotos, cartas, lembranças, cartões, bilhetes. E jornais desbotados onde escrevi ou entrevistei treinadores (Artur Jorge, Eriksson, Fernando Santos, Scolari e Frederico Varandas mais recentemente) e jogadores de excelência.

4 O futebol mantém-se o maior espectáculo do mundo, o maior fenómeno do mundo, o maior produtor, agregador e distribuidor de emoções; o maior motor de instantânea, automática, permanente, convocatória. O maior traço de união entre os humanos, sejam eles quem forem, de onde forem, de que cor e credo, idade ou sexo.

Há quem odeie tudo isto? Há claro. São uns infelizes. Nunca conheceram o grau de jubilo ou a temperatura a que pode chegar uma colectiva emoção ao ver a bola a entrar nas redes adversárias e com isso garantir um jogo, um titulo, uma taça. Ou que não garanta: há golos e lances e passes e “cantos”tão fenomenais que por si só iludem derrotas, redimem fracassos e ficam na história do futebol.

A morte planetária de Diogo Jota — admirável Diogo Jota e não apenas pelo dom com que jogava – nunca teria sido planetária fosse Diogo um genial pintor, um escritor prémio Nobel, um maravilhoso bailarino, o mais inspirado músico. Revejo o choque do país e a emoção digna da equipa do Liverpool, a vinda a Portugal do clube britânico em peso — dirigentes, jogadores, técnicos; o luto e a mobilização de milhares e milhares de ingleses, a surpreendente........

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