A Primeira Emenda em segunda mão
Nenhum princípio é tão basilar à fundação dos Estados Unidos como a liberdade de discurso. A disposição para tolerar diálogos subversivos e ofensivos, sem qualquer limite legal, sempre contrastou com outras democracias, nomeadamente as europeias, que regulam certos tipos de discurso, inclusive discurso de ódio – cuja própria definição é muitas vezes fluida e subjetiva. Na prática, o que nas democracias ocidentais se entende como liberdade de expressão é apenas uma versão limitada da liberdade de discurso americana.
Há cerca de uma década, a emergência da “cancel culture” nas universidades americanas abriu uma nova frente contra este princípio inscrito na Primeira Emenda. Tornou-se rotina impedir figuras controversas, geralmente dos círculos conservadores, de falarem em campus universitários, sob o argumento de que palavras, por si só, constituem uma forma de violência. As consequências desta visão foram tragicamente antecipadas pelo psicólogo Jonathan Haidt que afirmou que, num período de polarização acelerada, essa lógica poderia facilitar a aceitação e até a justificação de violência política.
A rejeição deste paradigma foi uma das maiores plataformas de campanha de Donald Trump. Num dos seus primeiros discursos de inauguração, prometeu erradicar qualquer forma de censura governamental e restaurar a liberdade de discurso no país. Ainda, no seu primeiro dia na Casa Branca, assinou uma ordem executiva para garantir que nenhum funcionário federal participasse em atividades que, inconstitucionalmente, restringissem a liberdade de discurso de qualquer cidadão americano. Mais tarde, foi nesse mesmo registo que o vice-presidente JD Vance, em Munique, vestiu a armadura de cavaleiro da liberdade, denunciando o que considerava ser a ameaça europeia a este direito.
A ironia não tardou. Após o assassinato do ativista Charlie Kirk, os círculos MAGA lançaram........
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