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Ai, ai, ai, que nos levam o território!

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29.08.2025

Estamos todos sob efeito das imagens dos fogos e dos sinais que deixam. A partir de 30 de Julho, com os incêndios de Arouca e Cinfães, o noticiário do fogo entrou em ritmo diário, com alguns invulgarmente duradouros, como o de Arganil, que passeou a devastação brutal por vários distritos limítrofes. Todos os dias as televisões deram horas e horas do Centro e Norte a arder. Já agora, uma questão que ouvi: foi assegurado estar provado que a transmissão nas televisões, imprensa e redes sociais, de imagens destes fogos com suas grandes labaredas, excita, como a Nero, os incendiários, que sentem o impulso irresistível de ir atear mais fogos. Se é verdade, deve proibir-se a difusão dessas imagens de Portugal a arder, o que impedindo o espetáculo sinistro, em nada prejudica o noticiário essencial. Isso foi estudado? Vai ser? Alguma medida para proteger o país e os portugueses?

Ouvimos e vimos o que já havíamos ouvido e visto, sobretudo em 2003, 2005, 2017. Agora, as circunstâncias foram as piores de que me lembro: nunca houve temperaturas tão altas e por tantos dias consecutivos, vento por vezes forte, com humidades muito baixas e ervas secas abundantes, depois das chuvas da primavera. Os bombeiros foram os heróis habituais, com risco enorme. Houve outros heróis civis. Alguns pagaram com a vida a sua dedicação e coragem. É por eles e pelas populações que temos a obrigação de fazer muito melhor.

Ouvimos queixas antigas. O desmantelamento dos guardas-florestais – alguma correcção à vista? Que o combate é muitas vezes tardio e errado, “antigamente, fazíamos contrafogos”, “hoje ninguém sabe fazer” – é assim? Alguma resposta quanto às técnicas de combate? O interior está completamente ao abandono, a queixa mais frequente dos autarcas – alguma política para alterar o quadro? A reestruturação fundiária, da posse e da gestão das áreas florestais está por concluir e marca passo. De facto, em 2005, quando fui Presidente do CDS, este já era problema bem identificado. Defini uma posição geral que chamei de “condomínio florestal obrigatório”, permitindo assegurar a gestão integrada de grandes áreas florestais e accionar a usucapião como instrumento para, respeitando as garantias de lei, pôr termo aos milhões parcelas sem dono. Nessa altura, já havia umas zonas desse tipo, mas não funcionavam muito bem. Vinte anos depois, o que está feito, o que falta fazer e quando se prevê que este problema estrutural fundamental esteja resolvido? Houve muitas denúncias de fogo posto e de misteriosos acendimentos nocturnos (metade dos registados) – alguém pode apresentar qual é a política penal do Estado português e reafirmá-la até a população ficar segura de que o assunto está bem agarrado?

Não há dúvida de que temos um sério problema com o território: estamos cotados como o país da UE com maior percentagem de área ardida: 3%. O território em crise frequente é vasto: distritos de Vila Real, Bragança, Guarda, Castelo Branco e Portalegre, serras de Leiria, Coimbra, Viseu, Aveiro, Braga, Viana do Castelo e Faro. E, se não devolvermos a administração ao território, os decisores políticos podem aprovar o que entenderem que as medidas não serão aplicadas bem e em continuidade.

Considero o território dos principais recursos estratégicos do país. Ele mesmo é um recurso de recursos, isto é, um recurso que guarda dentro si imensos outros recursos – que importa estar lá para defender, explorar e extrair. Quando não estamos, não aproveitamos.

Infelizmente, cuidamos geralmente mal do território – falta a Portugal contemporâneo a cultura de estratégia e de organização que já tivemos e que outros povos mantêm, cultivam e aperfeiçoam. O mar deixámo-lo ao abandono e completo desnorte, décadas a fio, desde os anos ’70 – e, embora retomado o interesse desde o começo deste século,........

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