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O plano de Trump para Gaza: virtudes e vícios

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02.10.2025

Donald Trump anunciou um futuro radioso, num discurso cheio de hipérboles, autoelogios e bicadas nos inimigos. Trump declarou até a paz perpétua, numa referência kantiana de que provavelmente nem faz a mínima ideia

Netanyahu engoliu o sapo das desculpas ao Qatar (aquele avião oferecido ao Presidente americano vale o seu peso), aplaudiu, e metade do mundo suspirou esperançoso: finalmente, um plano para o “dia seguinte” em Gaza.

Mas convém não exagerar.

Não é o fim da História, será provavelmente mais um capítulo na mesma novela sangrenta que resulta da rejeição árabe e muçulmana. Uns acreditam no cessar-fogo como salvação e outros profetizam que um cessar-fogo mal-amanhado é apenas o intervalo antes do próximo paroxismo de violência. Já houve outros acordos antes, anunciados ao mundo com pompa e circunstância, com distribuição de Nobel da Paz e tudo.

O resultado é o que se sabe.

O documento apresentado por Trump tem, ainda assim, virtudes raras neste tipo de exercícios diplomáticos: é curto, é claro, tem a sua vaidade por detrás, e até tem prazos-limite. Não é aquela sopa de palavras abstractas em que expressões como “horizontes políticos” servem apenas para tapar buracos e servir de biombos às reais intenções.

Aqui há um relógio a contar: Israel aceita o acordo e, no prazo de 72 horas, todos os reféns, vivos e mortos, regressam a casa.

Não é uma aspiração, é um ultimato com cronómetro. Só isto já o distingue das tentativas anteriores, onde se falava muito de avanços e pouco de resultados.

Mas, como sempre, o diabo está nos detalhes e na realidade fora dos corredores iluminados da diplomacia. Em Gaza o detalhe está armado, é fanático e suicida, tem uma ideologia e é financiado por Teerão, Doha, Turquia e outros actores tenebrosos.

O plano parece escrito para agradar ao eleitorado americano, a certos sectores maioritários da política israelita e a alguns poderes da aristocracia árabe, mas parece fazer de conta que, no terreno, quem decide se o acordo avança ou implode, não são os diplomatas engravatados, mas sim os jihadistas do Hamas, encafuados em túneis e munidos de RPG’s, bombas e um fanatismo implacável.

De qualquer forma o projecto tem coisas boas: cronómetros, clareza e uma promessa de reconstrução

Comecemos pelas virtudes. Há três que valem a pena sublinhar.

Primeira: a clareza operacional. O plano é explícito: primeiro os reféns, depois os prisioneiros palestinianos em Israel. Nada de trocas simultâneas, nada de jogos de sombras. Congelam-se as linhas de combate, regressam os reféns, depois Israel liberta 250 condenados a prisão perpétua e 1.700 jihadistas presos após o 7 de outubro. É arriscado, mas é claro. E na diplomacia do Médio Oriente, onde a ambiguidade é a norma e o tempo se perde em arabescos, mentiras e jogos de bastidores, a clareza é quase um milagre.

Segunda: a tentativa de misturar política com economia. Não se limita a desenhar........

© Observador