Casas a mais? Ao país falta é quem as possa arrendar em paz
Segundo o Jornal de Notícias, afinal o país tem centenas milhares de casas disponíveis, prontas a ocupar. Estão nos censos, nos satélites, nas estatísticas. Só falta, aparentemente, que alguém as abra. Se o artigo é provocador, o subtexto é mais grave: se as casas existem e não estão a ser usadas, o problema não é estrutural, é moral. A culpa é de quem tem, não de quem governa, ou governou. Como sempre, o inimigo é o proprietário.
Este tipo de discurso, que mistura ressentimento com ingenuidade, tem ganho terreno em toda a Europa. Políticos de todos os espectros políticos repetem variações sobre o mesmo tema: que o mercado falhou, que o Estado tem de intervir, que o direito à habitação se impõe sobre a propriedade privada. É o populismo habitacional disfarçado de justiça social. E como qualquer populismo, oferece culpados em vez de soluções.
O problema é que a realidade não se dobra à vontade de slogans vazios. As casas existem, sim. Mas estão fechadas porque quem as possui foi desprotegido pelo sistema. E essa desproteção não é uma paranoia de ricos nem uma conspiração de fundos imobiliários. É uma resposta racional a um contexto regulatório e fiscal punitivo, moldado ao longo de décadas. Governos que confundem regulação com virtude e acreditam que fixar preços por decreto basta para anular a lei da oferta e da procura.
Hoje, em Portugal, ser proprietário é arriscado. O Estado trata a propriedade como um privilégio suspeito, não como um direito garantido. O sistema judicial é lento. A fiscalidade é volátil, pesada e penalizadora. A legislação muda consoante o vento político, introduzindo incerteza nos contratos e fragilidade na relação entre senhorios e inquilinos. E, como se tudo isto já não fosse mau o bastante, alimenta-se um discurso público que romantiza a........
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