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Quando a memória histórica se torna território político

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23.11.2025

As datas históricas têm o poder de fixar no tempo alguns acontecimentos que moldaram a identidade de um país, de uma comunidade ou de um colectivo. E, justamente por carregarem esse peso simbólico, tornam-se muitas vezes objecto de disputa, que se consolida ou atenua com o passar do tempo.

O 25 de Abril e o 25 de Novembro inscrevem-se nesse território da memória colectiva e partilhada, onde cada um empresta a sua visão e interpretação às respectivas datas.

O que deveria ser um espaço de memória partilhada transforma-se assim num campo de apropriação política, onde as diferentes forças procuram reivindicar um significado exclusivo para aquilo que, à partida, pertence a todos.

Esta apropriação não é nova nem exclusiva de Portugal. É quase inevitável que datas com forte carga histórica, como foram o 25 de Abril, o 25 de Novembro ou outras marcantes, sejam lidas à luz das sensibilidades e narrativas políticas de cada época, e como tal também evoluam.

O problema surge quando essa leitura deixa de ser uma interpretação legítima e se transforma numa tentativa de monopolizar o sentido da história, apagando complexidades, silenciando memórias e instrumentalizando o passado para servir interesses presentes.

As recentes disputas sobre as cerimónias evocativas de cada uma dessas datas, e a que agora aqui nos traz, a do 25 de Novembro, são prova disso.

Cada data contém múltiplas experiências: foi resultado de circunstâncias diversas, decorreu da conjugação de uma miríade de acontecimentos, as vividas pelos protagonistas, as sentidas pela população, as registadas pelos historiadores e as reinterpretadas pelas gerações seguintes. Quando um acontecimento histórico é capturado e fixado por uma só visão política, a memória perde profundidade, complexidade, e o país perde a oportunidade de crescer sobre uma compreensão mais matizada do seu percurso colectivo.

Por outro lado, também a sociedade, através da opinião pública e dos meios de comunicação, participa nesta disputa simbólica. Muitas vezes, simplificamos datas densas e contraditórias para as encaixar em narrativas confortáveis. Outras vezes, reagimos apenas aos discursos mais visíveis, esquecendo que a história raramente cabe em slogans, e que a realidade é complexa e plural.

Reconhecer a pluralidade das memórias não significa diluir o significado das datas, pelo contrário, significa enriquecê-lo.

Uma democracia madura não teme debates sobre o passado, acolhe-os. O confronto de perspetivas não diminui a história, ilumina-a, clarifica a nossa visão, depura a nossa compreensão.

Quando aceitamos........

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