Anatomia de uma Guerra Anunciada, As Décadas de Erros
A guerra que consome, aos dias de hoje, o Médio Oriente não começou com o estrondo das bombas americanas, através dos tão conhecidos B-2, a 21 de junho, nem com o zumbido dos caças israelitas na noite de 12 para 13 de junho. Na verdade, este conflito começou há quase meio século, em 1979, nas ruas de Teerão, com a queda do Xá e a ascensão de um regime cuja identidade se forjou na hostilidade ao Ocidente. Os ataques deste mês não são a causa da doença, mas apenas a febre que finalmente irrompeu, a consequência inevitável de décadas de uma arquitetura de desconfiança que foi meticulosamente construída por todos os lados.
Este artigo defende que a sequência de eventos, que culminou na guerra aberta, é a prova final de uma tragédia anunciada. Demonstra um sistema de segurança regional falido, onde um ator, sentindo uma ameaça existencial, se sentiu compelido a agir unilateralmente, criando um caos tão perigoso que forçou o seu principal aliado a intervir, não por escolha, mas por necessidade. Para entender esta catástrofe, é preciso analisar não só a longa história da desconfiança, mas a lógica febril que ditou as ações de Israel e, subsequentemente, a entrada, calculada, dos Estados Unidos no abismo.
A Arquitetura da Desconfiança: Os Três Pilares da Tragédia
Esta tragédia geopolítica assenta numa arquitetura de desconfiança meticulosamente construída ao longo de décadas, reforçada por três pilares que se alimentaram mutuamente até o colapso se tornar inevitável. O primeiro pilar é a ferida histórica e o espelho ideológico que dela resultou. A desconfiança não nasceu do vácuo; tem uma certidão de nascimento em 1953, quando um golpe orquestrado pela CIA para derrubar o Primeiro-Ministro Mohammad Mosaddegh cimentou no Irão a convicção de que a sua soberania seria sempre secundária aos interesses ocidentais. A Revolução Islâmica de 1979, com a sua retórica do “Grande Satã” e a negação do direito de Israel a existir, foi a resposta violenta a essa memória, forjando por sua vez em Washington e Tel Aviv um medo simétrico e intransigente de um regime teocrático e expansionista. Foi sobre este alicerce de hostilidade que se ergueu o segundo pilar:........
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