Espelho Meu, espelho meu, a medicina estética ou o “eu”?
Há dias dei por mim a ouvir um podcast, uma conversa aparentemente inofensiva sobre medicina estética, que me pôs a pensar. Entre entusiasmo com botox, preenchimentos e lasers começou a falar-se do papel da medicina estética na saúde mental das pessoas. Confesso que o meu primeiro impulso foi parar o episódio (apesar de este até nem ser dos piores sobre este tema, longe disso), mas, como psiquiatra que já viveu o suficiente para saber que o mundo não é preto e branco, continuei a ouvir. Afinal, as nuances são coisas escassas no discurso contemporâneo, embora seja com elas que trabalho diariamente, com o sofrimento emocional de pessoas reais, que não se medem em simples “antes e depois”.
Sim, é verdade que em alguns casos a medicina estética pode aliviar o sofrimento psíquico. Já escrevi, enquanto médica psiquiatra na Alemanha, um parecer a favor de uma cirurgia para uma paciente que, depois de uma perda de peso drástica, sofria com o excesso de pele abdominal ao ponto de se sentir impedida de ter intimidade. O impacto na sua autoestima e vida emocional era significativo. Neste caso, o procedimento não era um capricho nem fruto de uma doença mental, era sim uma necessidade. Mas não é com estes casos que me preocupo. O que me assusta, e o que parece estar a escapar à consciência coletiva, é a escalada astronómica e desenfreada de intervenções estéticas que estão a ser vendidas como sendo “equivalentes” a saúde mental, quando muitas vezes são apenas “pensos rápidos” para problemas emocionais e psicológicos profundos.
Um “folhear” da........
© Observador
