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Ciclos de crise e instabilidade emocional (IV)

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06.09.2025

Damos agora continuidade ao relato de um percurso que ilustra de forma clara como um ambiente de violência doméstica, ainda que sem agressões físicas, pode evoluir para um processo de alienação parental, marcado pela manipulação emocional, conflito de lealdades e rutura de relações familiares significativas.

O testemunho do José revela como as dinâmicas conjugais, caracterizadas por surtos de raiva e episódios de instabilidade da mãe alienadora, acabaram por envolver a filha Maria desde muito cedo, conduzindo à sua instrumentalização e afastamento progressivo da família paterna alienada. Respondendo à questão “como e porquê o processo evoluiu para dar lugar à alienação parental?”, o José explicou como se deu a evolução até à alienação parental.

José contou-nos como se iniciaram os episódios de violência psicológica e instabilidade emocional da mãe alienadora: “Mas como e porquê se iniciou e desenvolveu o estado de violência doméstica, sempre e só de manifestações e altercações verbais, aparentemente sem causa expressa, mas ligadas a alterações súbitas do comportamento da mãe da minha filha, com durações pouco regulares, que mais tarde viriam a ser ligadas a surtos psicóticos conotados com transtorno borderline”.

Neste testemunho pode observar-se uma forma de violência doméstica que não deixa marcas físicas, mas provoca um enorme desgaste psicológico, com episódios de agressividade verbal, sem causa aparente, seguidos de períodos de calma. Este padrão é profundamente confusional para quem convive de perto com as pessoas alienadoras, porque gera a sensação de se estar sempre no limite de ter que encarar uma atitude explosiva, sem saber quando virá. Para o José, o efeito é de uma constante insegurança, porque nunca sabe o que desencadeia a raiva da mãe alienadora, nem como se pode proteger dela. Vive assim num estado de alerta permanente.

Para a criança, mesmo muito pequena, este ambiente transmite instabilidade. O ambiente familiar deixa de ser previsível e passa a ser um espaço de tensão latente. As figuras parentais, que deveriam representar segurança, transformam-se em fontes de ansiedade, a mãe por causa das explosões, o pai porque não consegue travá-las.

Do ponto de vista clínico, estes episódios revelam-se compatíveis com perturbações emocionais graves, em que explosões de raiva súbita da mãe alienadora são seguidas de períodos de normalidade, deixando a família em constante instabilidade e imprevisibilidade.

No seu testemunho, o José reportou-se ao nascimento da filha para explicar a origem de tensões que, aparentemente banais, se transformaram em fonte de conflito persistente: “Há que recuar a dias após o nascimento da Maria, uma menina linda, a minha única filha, onze dias, para ser exato, por coincidência no dia de aniversário da mãe e na sequência da primeira consulta de pediatria, foi de consenso uma visita a casa dos meus pais, sedentos de poder mimar a neta, muito embora tivessem estado com ela na maternidade. Naturalmente que a visita proporcionou um corrupio de colos, pelos diversos elementos da família que ali se encontravam, desde os meus pais, alguns sobrinhos e até uma minha cunhada. No decurso de conversas de circunstância e num momento de ausência da mãe, fiz referência ao facto da Maria me haver arranhado com as suas unhitas, durante a noite, pelo que necessitaria que fossem aparadas. Confessei o meu pouco à vontade, ainda, com tal obra e entendi pedir à minha cunhada se se importaria de o fazer por mim – mãe de quatro filhos e educadora de infância. Acedeu, com a minha insistência, ainda que eu não tenha notado que o faria com algumas reservas (só muito tempo depois, anos, isso me tenha sido revelado por ela, por razões que considerava óbvias – o sexto sentido feminino). Entretanto, entra a mãe no quarto onde estávamos. Nada aconteceu. Tudo normal. A visita terminou. Beijinhos e despedidas e retornámos a nossa casa”.

Um episódio banal, o corte das unhas da bebé por uma tia experiente, foi, no entanto, reinterpretado pela mãe alienadora como um gesto de humilhação e desautorização. A recordação persistente e carregada de ressentimento mostra um funcionamento psicológico em que pequenos acontecimentos se cristalizam como feridas narcísicas. Este mecanismo de fixação leva a uma leitura distorcida da realidade e alimenta uma desconfiança crónica. Para o José, isto foi incompreensível, porque ele criou a situação com um propósito de cuidado e proteção, mas viu essa intenção ser invertida e usada contra si. Para a filha, ainda recém-nascida, este momento passou despercebido. Contudo, com o mesmo se inaugurou um padrão que marcou o futuro, acontecimentos neutros passaram a ser reinterpretados pela mãe alienadora como afrontas, que depois justificavam a raiva e hostilidade. Foram episódios de explosões emocionais, sempre imprevisíveis: “Semanas foram passando e um dia, estranhamente, a mãe mostrou-se colérica, numa explosão de raiva e ódio, sem razão aparente, falava de uma “ela”, insultava-a, num pranto de raiva, de choro e de gritaria; teria a Maria uns 2 a 3 meses e ameaçava querer ir-se embora, sair de casa e deixar-me com a nossa filha, assim, sem explicações. Contudo, assim como o surto veio, assim se foi e tudo voltou à normalidade, aparentemente. Achei que........

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