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Matar o pai

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19.08.2025

Aquilo que uma criança reconhece e espera do pai não é, no essencial, tão parecido com o que coloca sobre os ombros da mãe. À função materna atribui a presença constante, o cuidado, o colo, o mimo, o carinho, a protecção ou o controle das regras, por exemplo. Enquanto do pai espera a combatividade, a força, o sentido de justiça, o espírito guerreiro, a tenacidade, a garra, a perseverança ou o furor divertido. Como ingrediente secreto, o pai é ”o distraído oficial de todas as famílias”. Convencionou-se que “desliga” e não ouve. Que, ao contrário da mãe (que faz muitas coisas ao mesmo tempo e cuja cabeça são check-lists quase intermináveis), o pai não faz senão uma coisa de cada vez. Quando se zanga acaba por ser mais intimidatório porque, habitualmente, é maior e tem a voz mais grossa. Mas, até lá chegar, deixa que tudo se passe à volta dele como se não percebesse quase nada. Daí que quando o pai diz: “Precisamos de ter uma conversa…”, o registo habitual é de temor. Tais são tão esparsas as vezes em que o faz.

A mãe é uma bocadinho “mãe-coruja”, “mãe-galinha” ou “mãe-helicópetro”, o que quer dizer que as mães adoram estar sempre presentes em tudo aquilo que sentem como indispensável para os filhos. O pai é mais “guarda-chuva”. Protege. Mas não reclama a preponderância que a mãe exige para si.

A mãe, com se compreende, tem, desde o momento em que ele nasce, um protagonismo enorme na vida de qualquer filho. O pai, apesar de todo o seu amor, acaba por ser uma “segunda figura”, considerando a intensidade e a alma imensa que a relação entre uma mãe e um bebé acaba por ter. Tão segunda figura que muitos pais, depois de serem pais, parecem adequar-se, perigosamente, a esse papel, como se à paridade entre uma mãe e um filho nunca conseguissem chegar. A ponto de a psicanálise, na sua linguagem cheia de metáforas, chamar à entrada do pai nessa relação tão intima e exclusiva, a introdução do terceiro. Como se o pai acabasse por ter uma preponderância indispensável a fazer a ponte entre o mundo mágico de uma criança com a sua mãe e o mundo “real”. Sem que, todavia, parecesse fazer parte dessa magia por........

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