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Como as elites culturais se tornaram excedentárias

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20.03.2025

Esta publicação fala de uma das transformações sociais mais significativas no ocidente, o processo de decadência e irrelevância das tradicionais elites culturais de áreas como as humanidades e as artes. Algum do debate político reputa o descrédito destas elites por serem uma deriva pós-marxista ou pós-moderna, o que não é factual, trata-se, regra geral, da reprodução da ideologia liberal progressista, que subsumiu o liberalismo cultural e também o novo esquerdismo. Quanto mais liberais são os países, mais o progressismo e a sua ramificação wokista ganham força – como se observa nos países anglo-saxónicos.

Chamamo-las elites porque, no Ocidente, o sector cultural da burguesia, como os intelectuais tradicionais, escritores, figuras dos média, atores, artistas e produtores culturais, académicos dos cursos de papel e caneta, quando alcançavam prestígio, desempenhavam um papel significativo e tinham um estatuto elevado. Estes tinham peso na opinião pública, moldavam o pensamento e tinham relevância na sociedade. Esse tempo acabou, a sua importância desvalorizou-se na opinião pública e no impacto na modulação do pensamento. No caso português a realidade ainda é mais penosa, pois essas elites vivem num estado crónico de dependência estatal e condenados à irrelevância cultural.

O papel típico destas elites é já principalmente performativa, como podemos observar em festivais de cinema, encontros literários, eventos da média e até em programas televisivos que misturam entretenimento e informação. Estas estão circunscritas a sinalizar quase em circuito fechado e sempre de modo monotemático a virtude do momento e a propagandear o pensamento único do bem derradeiro contra as supostas ameaças crescentes na sociedade. A cultura, os intelectuais e a média do sistema repetem sempre os mesmos discursos: Musk é mau, Trump é tenebroso, as alterações climáticas são um apocalipse iminente, o fascismo está a caminho, o Ocidente é racista e machista, a homofobia cresce exponencialmente, a democracia está em risco, e assim por diante.

O seu unanimismo artificial está bem patente na produção do consenso imposto, são todos Black Lives Matter, #MeToo, anti-Trump, entre outros. Da mesma forma, nos grandes canais do sistema, nunca falta o especialista de serviço para reafirmar até á exaustão a sua profissão de fé contra Trump ou, por cá, contra Ventura. Quem vê e/ou ouve um, ouviu todos.

Em Portugal esse unanimismo é ainda mais insuportável, comentadores televisivos, colunistas de jornais como o Público ou o Expresso e académicos convidados tendem a repetir narrativas progressistas importadas sobre — mudanças climáticas, desigualdade de género, críticas ao populismo—, muitas vezes sem uma adaptação crítica às especificidades locais. Esse unanimismo por cá é agravado por uma tendência histórica de imitação cultural: as elites locais muitas vezes espelham discursos de centros globais em vez de produzirem uma crítica original enraizada na realidade nacional. O caso mais notório é o da ascensão do Chega, abordado como um “fascismo iminente”, ecoando o alarmismo internacional sobre Trump ou Marine Le Pen, quando o problema é outro, no caso nacional, a estagnação económica, a crise habitacional, os baixos vencimentos e oportunidades, onde a política funciona como uma casta de interesses e privilégios não acessíveis à maior........

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