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Eles têm medo de que não tenhamos medo. Crónica de Margarida Davim

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“Estão com medo? Quem trabalha uma vida inteira não tem medo de nada. Devem estar com medo de perder os tachos.” A frase não espera resposta. É um escarro atirado ao chão das redes sociais. Ninguém escreve à espera que lhe respondam. Escreve-se para deixar uma marca no chão. Escreve-se como quem atira pedras e foge. Pois, se alguém há de ir contra a ideia de uma ditadura, claro que o faz por medo. Talvez seja um bot a escrever. Sei que há armazéns cheios de telefones e fios ligados a máquinas que alimentam o ódio e nos fazem perder tempo a discutir com robots programados para nos incendiar de indignação até às cinzas da alienação. Mas respondo ainda assim. “Não tem medo? Não tem medo de perder o trabalho? Medo de perder o teto? De ficar doente e não ter médico? Temos medo, sim. Infelizmente, trabalhar não dá garantias de nada. E é por isso que é preciso lutar por um mundo mais justo, com menos medo e mais liberdade.”

Fico sem resposta. Vivemos num mundo de barricadas. De um lado e do outro, há medo. Mas nenhum de nós está disposto a reconhecer o medo do outro. Apagamos a luz e saímos do quarto, garantindo que não há monstros debaixo da cama. Mas o medo fica, farejando o escuro, deslizando pelas coisas, transfigurando-as. Um trabalhador de pele escura, que luta para enviar dinheiro à família e trabalha até que lhe sangre a alma, transforma-se num perigo, numa ameaça. É ele........

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