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Uma oposição periférica

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18.04.2025

Há dois meses, Portugal entrou em convulsão, inicialmente, por causa da nova “Lei dos Solos”. A possibilidade de incompatibilidades, tráfico de influências e corrupção que podia advir de os governantes terem imobiliárias, levou à primeira de duas moções de censura ao governo, que acabou por cair.

Como a habitação é dos maiores problemas atuais da sociedade portuguesa, era fácil acender o rastilho. E foi tal e qual o capitão Renault quando o general alemão aterrou em Casablanca, no meio da guerra, depois da morte de dois dos seus correios. Como o assunto era quente, foi-se atrás do dobro dos suspeitos do costume. Neste caso, de meio governo.

Enquanto escrevo, a habitação parece já ter vitimado, também, Pedro Nuno Santos.

Curiosamente quando, entretanto, a Comissão Europeia apresentou o Plano Rearmar a Europa/Prontidão 2030, anunciando que os Estados Membros mobilizarão 800 mil milhões de Euros para financiar um aumento das despesas de defesa, a oposição, que teve nas incompatibilidades, tráfico de influências e corrupção o alfa e o ómega da sua política do último mês, não viu aqui momentum para discutir a necessidade de revisão, ou não, do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, vulgo lei das incompatibilidades, os custos da burocracia, nem de pressionar a regulação do lóbi.

É que, vejamos, o dito Plano dá aos países da UE mais flexibilidade financeira através da ativação da cláusula de escape nacional do Pacto de Estabilidade e Crescimento, permitindo que os Estados-Membros aumentem os gastos com defesa até mais 1,5% do PIB, fazendo entrar, por esta via, 650 mil milhões de euros no mercado comunitário para o rearmamento europeu, desenvolvido e construído na própria Europa, nos próximos quatro anos. Acresce-lhes um instrumento de empréstimos de 150 mil milhões de euros a custos baixos para os Estado Membros, o Security Action for Europe (SAFE), que nos ajudará a investir em áreas-chave de defesa, como defesa antimísseis, drones e segurança cibernética e que o Ministro das Finanças fez saber que o governo português está interessado em usar.

Sabendo nós que (a) a defesa é um setor que industrialmente é transversal, dos têxteis e calçado inteligentes à metalomecânica envolvida no armamento, drones, mísseis, transportes (b) em que os contratos são maioritariamente públicos, (c) que a UE vai apoiar o Banco Europeu de Investimento no alargamento do âmbito dos seus empréstimos a projetos de defesa e segurança, (d) e acelerar a União de Poupança e Investimento para mobilizar capital privado, de maneira a que a indústria europeia de defesa não dependa apenas do investimento público, (e) que em Portugal está em cima da mesa a antecipação da revisão da Lei de Programação Militar, que estabelece o investimento público em meios e equipamentos para as Forças Armadas, (f) e que os ministérios da Defesa e da Economia estão a desenhar uma “via verde” para a contratação pública na área da defesa, parece-me estarem reunidas as condições para vermos estes assuntos para além da casuística, do tiro ao alvo Luís Montenegro e ainda sem a pressão da emergência que levou, em plena pandemia, a casos como o do fornecimento de máscaras pelas empresas do primo do sobrinho do ministro.

A única explicação para o silêncio da oposição é que olha para a guerra como Caruso, uma coisa “là in America”, e é verdade que estamos longíssimo de Kiev. O mesmo se depreende das declarações cautelosas do ministro das Finanças que afirmou que os gastos com defesa não devem ameaçar o nosso superavit orçamental ou aumentar o fardo da dívida do........

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