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Camilo, o Grande

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17.03.2025

Aproximam-se as comemorações do bicentenário do maior prosador lusitano e primeiro profissional das letras, o inimitável Camilo. Efeméride relevantíssima neste Portugal desaportuguesado, cuja importância é inversamente proporcional ao burburinho que sobre ela fizeram políticos, eminências pardas, catedráticos e demais pobres tolos farfalhudos e coquetes, que por ela passaram à ilharga. De facto, tamanho silêncio ou é ignorância ou é alfinetada voluntária. Sed contra: talvez as duas e ainda uma terceira, que nisto da estupidez não há lei do terceiro excluído. Respondeo: é apenas mais um flagrante exemplo daquela “superficialidade calaceira com que em Portugal se passa por cima da História”. Inapropriável pelos senhores dos sucessivos regimes que nos vão desgovernando – esses senhores que tendem a enfardelar os valores -, o génio de Camilo incomoda e morde, como os cães do José Dias morderam o nalgatório do Sor Zeferino.

Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco, mais tarde feito 1.º Visconde de Correia Botelho por S.M.F. D. Luís, nasceu em Lisboa no dia 16 de Março de 1825. Alto, façamos uma breve cesura aqui, que é o enjambement da prosa quando tropeça numa revelação espantosa. É que até no local de nascimento se lhe lobriga a refinada ironia com que o destino o brindara. De facto, de lisboeta Camilo tinha pouco ou nada, tendo sido antes o Norte – a Samardã de Trás-os-Montes, o Porto, Vila Real, Penafiel e sobretudo São Miguel de Ceide, onde terminou abruptamente os seus dias – a sua Pátria. Como escreveu Teixeira de Pascoaes, “É como se Maomé tivesse nascido na Gronelândia. (…) Onde Camilo nasceu, ou, antes, renasceu, foi na Samardã de Trás-os-Montes. Aquela serrania é a mãe do seu renascimento, e o depôs em berço de fragas, não em corpo, mas em alma predestinada”.

Da sua irrequieta peregrinação terrena – em que amiúde passou pelas forcas caudinas com ironia e pundonor, espécie de desprendimento cavalheiresco -, diremos que, se a virtude camiliana é a fatalidade do........

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