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Quando a música acaba

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21.02.2025

Para onde quer que olhemos, o mundo mediático e político agita-se sob frémitos de excitação, quando não histeria, recebendo cada notícia, boato ou comentário com todo o tipo de reacção. Há, naturalmente, quem se indigne profusa e sonoramente, há quem se preocupe quedado em choro virtuoso e, também os há, aqueles que exultam de alívio pela revolução anunciada. Refiro-me, como deverá já ser evidente para a maioria dos leitores, às ondas de choque que Donald Trump, o patinho feio ora feito líder do mundo livre, causa por este nosso continente fora, ondas tão fortes que se fazem sentir por igual desde a capital burocrática do continente, Bruxelas, até ao mais ocidental e alienado arrabalde europeu, a república portuguesa.

A política internacional entra agora, em modo directo e “breaking news”, por Portugal dentro, uma novidade à qual não estamos, de todo, habituados. Uma razão para a novidade passará pela crescente abdicação de soberania que os últimos governos, incluindo este em funções, e começando no primeiro de António Costa, aceitaram com humilde e resignada mão larga. O país, como se sabe, optou na última década por, à conta do Quantitative Easing do BCE, implementar uma agenda política de contas públicas controladas, é certo, mas cristalizada, sem verdadeira reforma, onde aquilo que se gastou em novo pessoal, projectos de diferentes tipos e grandes esbanjamentos a tapar buracos de bancos, empresas de aviação ou de aquecedores — em nome da independência nacional!, atente-se na contradição —, pagou-se caro numa lenta, mas cada vez mais perceptível, quebra de qualidade de vida, declínio acentuado dos serviços públicos, em particular na área da saúde, tal como, consequentemente, a uma redução da discussão política à virgula orçamental que, de acordo com todos os políticos, de Ventura a Mortágua, se colocada na casa decimal por cada um deles defendida, assim é que se salvaria a economia nacional.

Não se salvou. Nem a economia, nem a soberania, deitada fora junto com a completa abdicação da autonomia nacional na decisão estratégica de longo prazo sobre os destinos do próprio país. Em boa verdade, tal coisa está nas mãos — que, como desde há muito, o político português, palonço e saloio, sempre sentiu como melhores que as suas — dos estrangeiros lá de fora, da “rica e civilizada” Europa. Daí que agora se discuta abertamente política europeia e norte-americana à grande no espaço público português. Não é que o povoléu o tenha vindo exigir, subitamente, para as portas dos jornais, ou que o jornalismo indígena se tenha tornado abruptamente cosmopolita, o ponto é que de governação nacional, de reforma autóctone, de opção estratégica e polémica política nacional, disso, tirando a agora celebrizada novela anual “do Orçamento” não há nada, nicles, tudo desaparecido num marasmo de monótona pasmaceira onde, em nada se passando, sobre nada se pode discutir com particular interesse.

Costa, parece, levou o frenesim e a agitação política consigo para o Conselho Europeu, enquanto Montenegro, sem maioria, entalado entre, à esquerda, um touro desnorteado socialista que vai perdendo o fôlego para terras progressivamente mais radicais, isto enquanto exigindo mais impostos e mais despesa, e, à direita, um bisonte frustrado que, igualmente estatista, exige mais despesa apenas que junta com menos impostos, vai o Primeiro-ministro, entre o que não pode nem consegue fazer, apostando no “viver como habitualmente”, estratégia político-partidária que talvez venha a dar frutos para si — convencer o centro socialista que em tempos deu a maioria........

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