Salazar, o “fascista” que calou os fascistas?
Acusar o Professor Doutor António de Oliveira Salazar de ter sido fascista representa, para qualquer pessoa que estude Ciência Política com seriedade metodológica e sentido crítico, uma tese tão infundada quanto é conveniente aos interesses de certa militância ideológica. A facilidade com que esta rotulagem é feita traduz não só um profundo desconhecimento da tipologia dos regimes políticos no século XX, como revela uma instrumentalização da História ao serviço de uma agenda contemporânea. Nas últimas décadas, particularmente após a Revolução de Abril de 1974, e com o domínio cultural da esquerda nas universidades, nos manuais escolares e nos meios de comunicação, cristalizou-se uma narrativa simplista: invocar o termo “fascismo” tornou-se suficiente para interditar qualquer possibilidade de debate sereno e intelectualmente honesto sobre o regime do Estado Novo.
Este é, aliás, o modus operandi da extrema-esquerda: em vez de demonstrar, rotula; em vez de argumentar, cancela; em vez de interpretar a História com rigor, moraliza-a segundo os seus critérios ideológicos. A aplicação do rótulo de “fascista” a Salazar tem servido como um instrumento de arremesso político, frequentemente usado para esconder a ignorância histórica de muitos comentadores e para justificar um discurso de natureza panfletária que dispensa qualquer esforço de contextualização. Mas se queremos cultivar uma relação intelectualmente honesta com o passado, então temos a obrigação ética e académica de recusar estes atalhos conceptuais.
A verdade, como frequentemente acontece, exige coragem. E essa coragem consiste, neste caso, em reconhecer que Salazar não foi fascista. Foi, sem dúvida, um ditador conservador, autoritário, clerical, mas fascista — no sentido político, sociológico e histórico do termo — não o foi. Dizer o contrário não é apenas uma imprecisão académica: é uma falsificação deliberada da História.
É necessário, antes de mais, estabelecer uma definição rigorosa. O fascismo, enquanto fenómeno político, não é um insulto arbitrário que se aplica a tudo aquilo que a esquerda radical detesta. É um conceito histórico que emergiu no........
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