Na encruzilhada do Inferno
A guerra entre Israel e o Hamas continua a gerar, todos os dias, vítimas inocentes e a criar imagens que chocam. Foi desencadeada pelo Hamas no horrendo ataque de 7 de Outubro. Não que alguma vez houvesse paz entre Hamas e Israel, mas desde a crise de Julho 2021 não havia fortes conflitos armados. O choque de 2021 provocou 300 mortos, na maioria palestinianos. Em princípio de Agosto de 2022, Israel bombardeou alguns locais, invocando ser ataque preventivo contra planos da Jihad Islâmica, outro grupo palestiniano. Verificaram-se 30 mortes.
A 7 de Outubro de 2023, a guerra rebentou de forma brutal, talvez a mais brutal que ali alguma vez se vira – e são muitas as guerras e brutalidades que têm acontecido no Médio Oriente. Às 6h00 da manhã, o Hamas lançou, sobre o Sul de Israel, o maior ataque terrorista de que há registos, mobilizando de surpresa mais de 6.000 militantes bem treinados – entre quase 4.000 combatentes das Brigadas Al-Qassam e mais de 2.000 civis fanatizados –, que venceram as vedações que separavam os dois territórios e entraram, sem piedade, por cidades vizinhas, vários kibutzim, bases militares e um festival de música, varrendo, num só dia, um território israelita mais extenso que a faixa de Gaza. Nesse dia sangrento, o Hamas tirou vantagem de haver iludido a segurança de Israel: o terrorismo à solta matou, ali, 1.195 israelitas (816 civis, sendo 36 crianças, e 379 membros das forças armadas e de segurança); fez 3.400 feridos entre civis e militares, do lado de Israel; e, escândalo dos escândalos, arrancou à força 251 reféns, levados, como arma e troféu, para os túneis e cárceres do Hamas, em Gaza. Do lado do Hamas, as fontes registaram ter sofrido, no ataque, 1.609 militantes mortos e 149 capturados pelas IDF (Israel Defense Forces).
O terror provocado pelo Hamas, nesse 7 de Outubro, correspondeu a uma orgia ímpar de crueldade, de horror e de humilhação para que é difícil encontrar paralelo, levando muitas das vítimas inocentes ao extremo da aterrorização antes de as abaterem, após tortura, ou queimarem vivas. É inimaginável o que viveram aqueles jovens, surpreendidos num festival de música: caçados como lebres, saltaram da diversão para a morte, passando pelo terror impiedoso. Podíamos ter sido nós – ou, pior, os nossos filhos ou filhas, as nossas netas ou netos. Não havia guerra nenhuma. Foi uma coisa que passou pela cabeça do Hamas.
Os relatos detalhados (e imagens colhidas pelos atacantes do Hamas!) continuam disponíveis para que ninguém possa dizer que não se sabe. Alguns relatos, sobretudo os que envolvem o massacre de crianças e bebés ou o abuso e a violação de mulheres, revolvem-nos as entranhas. Mas é preciso que as entranhas se nos revolvam para sentirmos um pouco (um pequeno pedaço apenas) da loucura furiosa e sangrenta que ali passou. O Hamas não tem justificação, nem atenuante. Pudemos ver, no Qatar, a alta direcção política do Hamas, receber, no final deste dia 7, no seu luxuoso escritório num dos arranha-céus de Doha, uma equipa de televisão que vinha colher a sua reacção. Ismail Haniyeh (então, ainda vivo) estava radiante com o ataque terrorista e seus resultados. Os cerca de seis dirigentes do Hamas ajoelharam-se e pondo-se de rojo rezaram. A quem terão rezado? E que diriam as orações? Não, o Hamas não tem justificação, nem atenuante.
É fundamental termos presente o terrível, traiçoeiro e cobarde ponto de partida desta guerra do 7 de Outubro, para entendermos o estado de espírito em Israel e no seu povo. Com o evoluir da guerra, que já vai em 669 dias ou 22 meses, com seus múltiplos confrontos e violências, podemos ter esquecido o 7 de Outubro e os seus horrores. Os israelitas, não – sobretudo aqueles que vivem em Israel e se sentem encurralados sempre que a História lhes bate outra vez à porta. O 7 de Outubro mostrou-lhes outra vez, com terrível crueldade, o destino que lhes está reservado pelos seus vizinhos. Basta que se distraiam por um instante, como naquela manhã. Os israelitas não se podem distrair.
A determinação da resposta de Israel é plenamente justificada. Assim como é justificado que queira erradicar de vez o Hamas e outros........
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