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Ibn Khaldun e a Melancolia das Civilizações 

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01.04.2025

Há um vento quente que atravessa os desertos do Magrebe, carregando consigo não apenas a poeira dos oásis esquecidos, mas os sussurros de uma verdade antiga: toda a grandeza humana é, afinal, um castelo de areia. Ibn Khaldun, nascido sob esse céu implacável, soube escutar o rumor das dunas móveis — não como geógrafo, mas como arqueólogo das ruínas ainda não erguidas. Na Muqaddimah, a sua obra-prima, ele não escreve história; desenterra ossos de impérios, examina as vértebras quebradas de dinastias, e interroga, como um médico do tempo: qual o mal que corrói os corpos políticos? A resposta, suspeitamos, não está nos palácios, mas na areia. Na areia que tudo cobre, na areia que tudo revela.

A história, para Khaldun, é um organismo que respira. Inspira na ascensão dos beduínos — homens duros como o solo que pisam, unidos por laços de sangue e fome — e expira na luxúria das cidades, onde o mármore substitui a argila, e os poetas cantam elegias para governantes que já não ouvem. A asabiyyah, essa força invisível que tece tribos em impérios, não é um conceito: é um sopro. Um sopro que infla os pulmões de um povo até que, inchado de poder, ele estoura. E então, como um animal ferido, a civilização recolhe-se, aguardando o próximo caçador que trará, nas suas mãos calosas, um novo fôlego.

Walter Benjamin, o flâneur das catástrofes, diria que a história é um anjo cujo........

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