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Tempos de violência política?

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17.10.2025

Desde o assassinato de Charlie Kirk, multiplicaram-se os artigos que denunciavam a violência e a intolerância da extrema-esquerda woke. Entre todos, foi, a meu ver, Xavier Eman — escritor e intelectual francês — quem melhor resumiu o comportamento de uma parte dos militantes de esquerda perante esta tragédia: “É verdadeiramente fascinante observar aqueles que qualificam a pena de morte aplicada a pedófilos, violadores e assassinos de crianças como uma barbárie desumana, mas que, paradoxalmente, se regozijam com o homicídio de um pai de família apenas por este não partilhar das suas opiniões. O autoproclamado “Campo do Bem” (a esquerda) revela, afinal, um rosto bastante repugnante.”

À primeira vista, poderíamos pensar que estamos perante duas facções irreconciliáveis: de um lado, a direita, tolerante e defensora do debate democrático; do outro, uma certa esquerda intolerante e violenta, incapaz de aceitar verdades que não sejam as suas e de se envolver num diálogo sério. É certo que, observando os dois últimos anos — a tentativa de assassinato de Donald Trump, o homicídio de Charlie Kirk, as manifestações anti-ICE violentas nos Estados Unidos promovidas por antifas, as manifestações em França, levadas a cabo pela extrema-esquerda, ou ainda os protestos no Reino Unido, protagonizados por islamistas e, novamente, por antifas, onde se ouviram gritos de “morte aos judeus” e “morte aos brancos” — seríamos levados a crer que toda a violência política emana da esquerda. Sim, a esquerda tem mostrado um rosto cada vez mais sombrio. Mas creio que é necessário evitar cair no mesmo erro dos militantes esquerdistas mais radicais: separar o mundo entre os “bons” e os “maus”. Não será a realidade mais complexa? E não serão as causas destas violências políticas mais profundas do que o simples “wokismo”?

Existe, sem dúvida, uma tradição de intolerância à esquerda que remonta à Revolução Francesa. Sem pretender cair em exageros ou caricaturas, foram os militantes de esquerda — mais do que os de direita — que instauraram uma atmosfera de intolerância no Ocidente. E, nessa tarefa, encontraram aliados inesperados na figura dos islamistas. Quem desencadeou, nos Estados Unidos e na Europa, o clima da cancel culture? Quem impediu professores de leccionar ou de proferirem palestras, ou escritores de apresentarem os seus livros? Quem queimou livros? Quem agrediu estudantes por defenderem uma ideologia considerada demasiado “patriótica”? Quem ameaçou de morte professores um pouco por todo o Ocidente, como sucedeu com vários docentes fisicamente ameaçados por antifas em França? Quem recorre sistematicamente à violência durante manifestações?

Não fora o deputado revolucionário Antoine Barnave quem justificara o assassinato do director da Bastilha, Bernard-René Jourdan de Launay — assim como as violências cometidas contra diversas pessoas entre os dias 14 e 23 de Julho 1789 — com a frase “Mais ce sang, est-il si pur?”. Barnave inaugurava uma lógica que viria a ser institucionalizada pelos movimentos de extrema-esquerda ao longo dos dois séculos seguintes, prolongando-se até aos nossos dias: a ruptura com a justiça institucional, a multidão erigindo-se em juiz e carrasco. Uma visão política que divide o mundo entre os oprimidos (os puros) e os opressores (os impuros), na qual os primeiros se arrogam o direito de exterminar os segundos em nome da “libertação dos oprimidos”, e, por fim, a legitimação da violência contra aqueles que procuram impedir o advento do paraíso na Terra (o socialismo).

Quantos massacres foram perpetrados aquando da Revolução Francesa — os de Julho de 1789, os de Setembro de 1792 e o genocídio na Vendeia — ou durante a Revolução Russa? E as execuções sumárias levadas a cabo pelos espartaquistas alemães em 1918-1919 (que provocaram uma resposta violenta dos chamados Freikorps)? Do mesmo modo, os assassinatos cometidos pelas Brigadas Vermelhas em Itália durante os “anos de chumbo” nas décadas de 1970-1980 (incluindo o de Aldo Moro) marcaram profundamente esse período. Que dizer das violências perpetradas pela Facção do Exército Vermelho na Alemanha, nas décadas de 1970 e 1980, ou dos assassinatos e ataques terroristas cometidos pelo grupo de extrema-esquerda Action Directe em França — que reivindicou mais de 80 atentados e homicídios entre 1979 e 1987? Sem esquecer os milhões de mortos do Grande Salto em Frente e da sangrenta Revolução Cultural na China, ou ainda o genocídio perpetrado pelos........

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