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A coragem de ser aborrecido

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03.07.2025

Na reunião matinal da clínica do dia nesta segunda-feira, como em todas as outras, os pacientes relataram aquilo que fizeram no fim-de-semana. Enquanto alguns foram a concertos, encontraram amigos e família ou saíram à estrada com a autocaravana, houve um doente que disse ter tido um fim-de-semana “aborrecido”. Mais tarde, em conversa com o doente consegui descobrir que o “aborrecido” fim-de-semana tinha sido na verdade, uma tarde bem passada a cuidar do jardim em casa e que, ao contrário do que se possa pensar pelo adjetivo previamente mencionado, não tinha sido de todo desagradável para o paciente. Porquê então chamar uma tarde assim de aborrecida? A resposta do paciente surpreendeu-me: comparado com os fins-de-semana “excitantes” dos outros pacientes o seu seria, na sua opinião, com certeza visto como enfadonho. Sendo assim, tinha evitado entrar em detalhes no âmbito do grupo.

Esta conversa deu-me que pensar. Será que o maior pecado dos nossos tempos é sermos “aborrecidos”? Será um atentado ao pudor não estar a par das últimas tendências ou fazer atividades dignas de um feed do Instagram ou de um reel do TikTok? Entre um constante bombardeamento com trends aparentemente vindas do nada (mas o que raio são Labubus?!) e notícias de diversos graus de relevância (não, não acompanhei os últimos desenvolvimentos do julgamento mediático celestial, sim, esse que estão a pensar) parece que deixou de ser permitido o ato de, pura e simplesmente, estar “na sua” em paz, sem se ter medo de ser acusado de ser retrogrado ou estar desatualizado. A casa do meu paciente bem pode ser o seu jardim, mas em 2025 ele que se livre de o anunciar por aí sob pena........

© Observador