Chat Control 2.0: um sorriso por detrás do bigode
Edward Snowden faz uma revelação surpreendente, trazendo a público o assustador programa de monitorização global da NSA e do FBI sobre todas as comunicações, mensagens, chats e dados cibernéticos dos utilizadores de diversos países – isto incluía civis e políticos de grandes potências mundiais.
O Governo Americano veio rapidamente argumentar que existia uma crise de segurança pública causada pelos sucessivos ataques terroristas que aconteciam e aconteceriam mais tarde por todo o mundo, e em prol desta segurança, todos os dados deveriam ser recolhidos e acessíveis ao governo americano, de forma a que este conseguisse antecipar qualquer ataque terrorista. Esta argumentação inspira mais tarde a narrativa do filme Capitão-América e o Soldado do Inverno (2015), em que um governo constrói uma máquina de vigilância global e monitorização de toda a informação de modo a antecipar golpes criminais, mas culmina no total controlo desses dados e armas por uma organização inimiga (a HIDRA). O medo da sociedade de risco traz monstros maiores e limitações desproporcionais aos direitos fundamentais.
A evolução digital cibernética caminhou na direção contrária à de Snowden e dos defensores da privacidade, tendo hoje as grandes companhias acesso a todos os nossos dados mais íntimos. A privacidade deixou de ser um direito, mas não foi por isso que ataques terroristas ou atentados deixaram de ocorrer. Temos regulamentos europeus e leis a tentar proteger os nossos dados e como estes são processados pelas diversas entidades, mas esta medida apenas veio legitimar a aquisição da nossa privacidade. Estas empresas aprimoraram os seus programas de monitorização: conseguindo ver quanto tempo passamos nas aplicações deles, gravar as conversas e mensagens que partilhamos com outras pessoas, gravar para onde olhamos no telemóvel, o que nos capta a atenção. Todos os nossos movimentos inconscientes, do nosso íntimo, são analisados e utilizados contra nós pelas empresas. As grandes companhias de tecnologia já admitiram que não estão num mercado de redes sociais ou de criar computadores, mas sim de extração e venda de dados. Nós somos o produto, pagando com a nossa própria identidade, que é partilhada e analisada por empresas e instituições públicas transacionais.
Por que recordamos estes episódios com mais de uma década? Ora, porque a UE, não aprendendo com os erros dos EUA, decide, mais uma vez, testar esses limites sobre a privacidade e as liberdades dos cidadãos. Chegou ao conhecimento público que foi feita uma proposta da Comissão Europeia denominada Chat Control 2.0. Esta proposta vem substituir a anterior regulação (Chat Control 1.0 – Regulamento 2021/1232) que permitia que as empresas-donas dos chats fiscalizassem as comunicações entre os........
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