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Quando o SNS se fecha às mulheres em situação de fragilidade

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19.07.2025

O cuidar exige presença. Escuta. Acolhimento. Mas muitas grávidas enfrentam um sistema que não as vê, não as entende e, pior, não as acompanha.

No início de julho, uma grávida de 31 semanas, residente no Barreiro, ligou ao SNS24 por fortes contrações e menor atividade fetal. Foi encaminhada para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa — a cerca de 60 quilómetros — sem que alguém confirmasse se tinha transporte, apoio ou sequer meios para lá chegar. Mesmo após mencionar não ter capacidade económica, a resposta foi desligar. Sem alternativa, recorreu ao 112. Horas depois, chegou ao Hospital de Cascais. Com o diagnóstico de descolamento de placenta, foi tarde demais. O bebé já não tinha sinais de vida.

E não é um caso isolado. Enquanto enfermeira de saúde materna, acompanho com frequência grávidas em situações semelhantes: sozinhas, sem transporte, sem literacia em saúde, sem domínio da língua e confrontadas com um sistema que presume autonomia onde só existe vulnerabilidade — linguística, social e económica.

O caso do Barreiro, por mais trágico que seja, é apenas a face visível de um problema mais profundo: a vigilância pré-natal deficitária nos cuidados de saúde primários. É aí que tudo começa — ou deveria começar. Quando a gravidez não é acompanhada com qualidade e proximidade, os riscos acumulam-se silenciosamente até emergirem de forma aguda nas urgências hospitalares. Não se trata de falhas isoladas, mas de um sistema que deixa estas mulheres para trás desde o início.

Na Margem Sul, muitas mulheres enfrentam múltiplas barreiras: fragilidade social, vigilância médica insuficiente, barreiras linguísticas e incerteza sobre onde poderão parir. Uma parte significativa é oriunda de países como Angola, Guiné, Nepal ou Bangladesh, chegando grávidas a Portugal, sem vacinas, sem consultas pré-natais e com patologias por diagnosticar. Para muitas, a gravidez é o primeiro contacto com o SNS.

E esse primeiro........

© Observador