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Fantasmas no Liberalismo

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06.06.2025

É talvez dos sintomas mais preocupantes do estado de desumanização a que chegámos. Chamam-lhe ghosting, e aqui o estrangeirismo é autorizado porque, na verdade, dificilmente se arranjaria termo que melhor encapsulasse o duplo significado do conceito: por um lado, a pessoa desaparece, deixa de se apresentar como real, palpável; por outro, fica a assombrar, como fantasma. E na latência entre as duas dimensões, acontece todo o problema. O fenómeno dá-se cada vez por toda a parte, das redes sociais que já vão tendo idade para que lhes chamemos “tradicionais”, às aplicações de encontros: duas pessoas conhecem-se virtualmente, começam a falar, a seduzir-se, fascinar-se, e, de repente, uma delas desaparece. Sem explicações. Pura e simplesmente, apaga o contacto; quebra a única ponte que permitiria ao outro segui-la, perguntar-lhe ao menos: porquê?

Porque é fácil, indolor para quem o faz. Porque se aborreceram daquela pessoa e apareceu outra nova, mais interessante e, assim, não têm de dar explicações, suportar o olhar desapontado ou destruído do outro. É como um simples bater de porta, despertar de um sonho, descartar para o lixo. O fim da empatia possibilitado pelo desastroso colapso das interacções humanas próximas, abdicar da comunicação não-verbal, da presença, do toque. Quantas vezes somos todos apenas imagens como outras quaisquer num ecrã? Desenho, fotografia, virtualidade gerada por uma máquina. O cérebro parece ter cada vez mais dificuldade em distingui-los – e o coração vai atrás. Com este requinte de maldade, inscrito algures, desde há muito, na condição humana: que........

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