A extrema-era-a-outra-direita
Vamos fingir, por um momento, que o Chega não é um partido que quer derrubar o “sistema” e que, em vez disso, poderíamos contar com ele para o reformar “por dentro”. Vamos fingir que o Chega não tem esse nome eloquente quanto ao que pensa e pretende, com um ponto de exclamação no fim. Que não se filia numa família partidária internacional de partidos apoiantes de regimes autocratas, dos Putins aos Orbáns da vida, e que o que faria, se o deixassem, não era implementar um do mesmo tipo em Portugal, naturalmente em torno do seu líder alegadamente indicado por Deus para salvar o país.
Vamos fingir que o Chega não quer, assumidamente, o fim desta república e começar uma quarta, assente num regime convenientemente presidencialista. Vamos fingir que o Chega não tem uma proximidade perigosa com grupos neonazis, que não grita “nem mais um” nas suas manifestações anti-imigração; que não ronda constantemente um discurso xenófobo e racista ou até que se sabe comportar na Assembleia da República. Finjamos que nada disto nos causa repulsa, não ofende os nossos valores, que é tudo exagero, que as “linhas vermelhas” foram um erro e que deveríamos poder contar com o Chega para formar a maioria de direita necessária para fazer as reformas de que o país precisa. Sim, imaginemos que, se os resultados das eleições de 18 de Maio assim o viessem a permitir, a direita moderada aceitava formar um governo de maioria com o Chega. O que sucederia depois? Que reformas seriam essas?
Para chegar a essas respostas, vamos ter de continuar a fingir mais um pouco. Vamos fingir agora que André Ventura aceitava ser número dois de um governo liderado pelo PSD (admitamos, para conveniência do exercício, que aceitava que o primeiro-ministro fosse Montenegro ou que o PSD........
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