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De que ri a vaca?

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31.10.2025

Em Las Meninas, Velázquez pinta-se a si mesmo a pintar; em Hamlet, Shakespeare faz representar uma peça que repete o crime da tragédia; e, em Dom Quixote, Cervantes cria personagens que leem o primeiro volume da sua própria obra. Chama-se a isto mise en abyme, expressão adotada pelo francês André Gide, recipiente do Prémio Nobel da Literatura em 1947, e que se pode traduzir como ‘inserção em abismo’. Gide não fez mais do que apropriar-se da expressão da heráldica medieval mettre en abyme – que significava literalmente colocar um escudo no centro de outro maior, como repetição simbólica do brasão principal –, reinterpretando-a no contexto literário e artístico.

Arte que se pensa a si mesma, reflexo tornado consciência – a mise en abyme é a tentação de se contemplar a si própria. Richard Strauss, em Ariadne auf Naxos, compõe uma ópera dentro da ópera; Leoncavallo, em Pagliacci, faz o drama repetir-se no palco; em La Reproduction interdite, Magritte pinta o espelho que devolve as costas do modelo; e, na atualidade, a........

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