Que Zambelli, a Madame Bovary de trabuco, tome realidade em vez de arsênico
A deputada Carla Zambelli (PL-SP) padece de uma doença moral e ideológica muito rara, cujo único remédio seria uma cápsula com altíssima concentração de realidade. Mas quem é que vai lhe ministrar esse tarja-preta? Trata-se de uma manifestação gravíssima de "Bovarismo de Extrema Direita".
Sim, o "bovarismo" designa uma espécie de delírio permanente de quem vive num mundo paralelo. O termo deriva, obviamente, de "Madame Bovary", romance de Flaubert, que Henry James considerava a obra seminal do realismo. Para Otto Maria Carpeaux, tratava-se do "romance perfeito". Sei que as ideias de centralidade e perfeição não parecem nem contíguas a Zambelli, mas ninguém, a exemplo desta senhora, encarna tão bem, nestes dias tristes, a distância entre o mundo dos fatos e o mundo da ilusão — ilusão, no caso, perversa.
Emma Rouault vivia uma vidinha aborrecida, mas tinha grandes ilusões. Casa-se com o médico Charles Bovary, endinheirado para um provinciano, mas distante das ambições que eram alimentadas pela mulher, que almejava uma vida mundana e venturosa. Dá tudo errado. Emma trai o marido, em especial com Leon e Rodolphe, se afunda em dívidas e acaba tomando arsênico quando se encontra sem saída. Não é a vilã do livro nem se cuida disso. Flaubert fustiga os hábitos burgueses, a hipocrisia, as convenções e a mediocridade intelectual dos moralistas. A obra gerou escândalo, e ele acabou nos tribunais, acusado de obscenidade. Pronunciou, então, uma frase que fez história: "Madamme Bovary c'ést moi".
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Não associo o roteiro cumprido por Zambelli ao vivido por Emma, é claro, mas o "bovarismo", entendido como uma estupidez delirante, em que a personagem almeja o impossível, atribuindo-se dotes que não tem, é patente nessa personagem melancólica da vida pública brasileira desde que o bolsonarismo passou a hegemonizar a direita.
