Mundos desfocados
No dia 11 de março de 1992 o Lusitânia Expresso chegou a águas territoriais timorenses. O Lusitânia Expresso era um navio português que, com o objetivo de sensibilizar a opinião pública internacional, viajou de Lisboa até Timor para alertar para a situação de opressão a que o povo timorense vivia, às mãos do regime da Indonésia. Aquando da sua chegada foi recebido por navios de guerra indonésios, não lhe tendo sido permitido alcançar terra. Suharto, presidente desse país predominantemente muçulmano, mantinha com mão de ferro um domínio sem alma sobre um povo pacífico e cristão, que culminou no massacre do cemitério de Santa Cruz em Díli, onde a 12 de novembro de 1991 morreram quase 300 pessoas.
A comoção e o clamor nacional eram grandes, as aspirações da expedição também, mas os efeitos práticos foram bastante discutíveis. Mesmo tendo Timor obtido a sua independência, é de crer que o Lusitânia Expresso seja mais uma curiosidade histórica do que um capítulo relevante nesse caminho, uma vez que pelo que se saiba, não foi notícia em mais nenhum país que não o nosso.
O facto de não ter sido notícia nos Estados Unidos da América foi notícia em Portugal – dada com funesto pesar por o golpe de publicidade ter tido tão pouco efeito. No entanto, a explicação para tal facto era simples: do outro lado do Atlântico, nesse preciso dia, era Super-Terça-Feira, dia de eleições primárias, onde muito se decidia da eleição do próximo presidente americano. Spoiler: ganhou Clinton, uma presidência que ficou marcada por terrorismo (World Trade Center em 1993, Oklahoma em 1995, Quénia e Tanzânia em 1998), o massacre de Waco (1993), bombardeamentos no Iraque, ou a nomeação da mulher para a task force para a reforma do sistema de saúde. Assim de repente, e não fosse ter nomeado a mulher para um cargo, e o seu gosto por charutos, poder-se ia dizer que pareceria o resumo da presidência de George W. Bush.
Lembrei-me do Lusitânia Expresso e do seu legado porque passados 30 anos o mundo está mesmo ao contrário. Se na altura o que preocupava Portugal não tinha importâncias em terras americanas, hoje, tudo o que passa em terras americanas é aparentemente de essencial importância nacional. Ao ponto de as........
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