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Olivença, meu amor

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18.04.2025

O artigo de Ricardo Sá Fernandes “Olivença, um caso de procrastinação crónica”, publicado, há poucas semanas, nesta série “Portugal 900 Anos”, chama-me a escrever sobre o tema, fundamentalmente para explicar a minha tese de “território português sob administração espanhola”.

Seguirei boa parte o último discurso que fiz na tribuna da Assembleia da República, há 10 anos, em 3 de Julho de 2015, ao abrigo dos meus direitos regimentais individuais. Foi seguido presencialmente, nas galerias do plenário, por uma delegação de Olivença, incluindo o, então, recém-eleito Alcaide de Olivença, Manuel González Andrade (sempre reeleito até hoje), bem como os autarcas das três principais forças políticas, Partido Socialista Obrero Español, Partido Popular (incluindo o anterior Alcaide, Bernardino Píriz) e Izquierda Unida, e cidadãos da sociedade civil oliventina que quiseram vir. Foi como se fosse o seu deputado. Depois, celebrámos na escadaria no Palácio de S. Bento. Uma festa!

O estatuto de Olivença à face do direito internacional e da Constituição, é sobejamente conhecido. Resumindo: é território português na posse de Espanha, por acto de guerra, e sob sua administração – guardem este retrato da realidade. Pela Acta Final do Congresso de Viena, de 1815, Olivença mantém-se território nacional e Espanha tem a obrigação de o restituir, obrigação nunca cumprida, apesar de se agitar repetidamente quanto a Gibraltar. Espanha sustenta o ponto de vista inverso ao nosso, com base nos factos de 1801, incluindo o Tratado de Badajoz, que pôs termo à fulminante Guerra das Laranjas, lançada contra Portugal pelo generalísimo Manuel de Godoy, chefe do governo espanhol.

A posição jurídica do Estado português é muito sólida. Não há qualquer razão para a mudar. E há um importante parecer da Procuradoria-Geral da República de 1951, que foi homologado, constituindo interpretação oficial a ter em conta em questões de nacionalidade. Além do Congresso de Viena, Portugal tem pelo seu lado a vigorosa denúncia a partir do Brasil, em 1808, pelo Príncipe-Regente (futuro D. João VI), com declaração de nulidade do Tratado de Badajoz. Este era, entre outros efeitos, um tratado de paz, a qual, como é bom de ver, foi flagrantemente quebrada e violada pelas tropas de Napoleão e espanholas que invadiram Portugal, em 1807, sob o comando de Junot – a 1.ª Invasão, a que se seguiriam mais duas. E, pouco antes da invasão, Napoleão e Godoy (o “príncipe da Paz”) haviam acordado o Tratado de Fontainebleau (e sua Convenção Anexa), documento secreto muito grave e vexatório para Portugal: acordava a ocupação total do nosso território e sua repartição aos pedaços por diferentes contemplados. Não é difícil imaginar a indignação provocada por estes factos.

Até 1801, a soberania portuguesa sobre Olivença foi sempre pacífica, desde o Tratado de Alcanizes, em 1297. Coube a D. Dinis acertar a última fronteira do território continental que faltava definir, das terras de Riba Côa até ao Alentejo/Extremadura. O tratado fixou Olivença entre as terras que ficaram do lado português, como outras ficaram do lado castelhano-leonês. Nunca houvera disputa por Olivença, nem veio a haver até 1801. Nem a breve conquista pelo Duque de San Germán, em 1657, pode ser contada: a ocupação espanhola à quinta tentativa foi um dos episódios da Guerra da Restauração. Nesta guerra, a questão não era Olivença, mas Portugal inteiro, o que acabou na paz estabelecida pelo Tratado de Lisboa, em 1668, com o triunfo definitivo do 1.º de Dezembro.

Calçada portuguesa no centro histórico de Olivença

Ao longo de cinco séculos, Portugal mostrou grande amor por Olivença, que tornou numa muito povoada e importante cidade do Alentejo. Logo à entrada, vindos de Elvas, vemos sobre o Guadiana as majestosas ruínas da velha Ponte da Ajuda, feita construir por D. Manuel I, em 1510, e destruída, em 1709, pelo exército espanhol, na Guerra da Sucessão. No belíssimo centro histórico de Olivença, vê-se a calçada portuguesa e todas as praças, ruas e travessas exibem, em azulejos, o nome actual espanhol e o nome antigo em português – há poucos anos, a pequena Talega adoptou a mesma prática na sua toponímia (Talega é um pequeno município, separado de Olivença no final do século XIX, mas parte também do “território histórico de Olivença”). As nossas raízes são orgulho oliventino, que guarda admirável património monumental português como marca de referência, de que as autoridades espanholas também cuidam bem: um precioso templo manuelino (a Igreja de Santa Maria Madalena), a Santa Casa da Misericórdia (que integra a nossa União das Misericórdias e possui uma magnífica capela), a Igreja de Santa Maria do Castelo, o Convento de São João de Deus, o Castelo e sua alta Torre, os Paços do Concelho (dito Paço dos Duques do Cadaval) com magnífico portal manuelino, ex libris da cidade, as muralhas e suas portas, edifícios históricos de referência que são um sinal de História rica que mergulha fundo na nossa expansão marítima, de Ceuta à Descoberta do Brasil. Uma terra alentejana, como se intui facilmente um pouco por todo o........

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