Não, não vem aí a nova era dourada do rust belt
Há um cheiro no ar do outro lado do Atlântico. Não é progresso, parece esperança, mas é apenas ferrugem requentada por retórica e eleitoral. Donald Trump, o hiperbólico profeta de um evangelho económico ultrapassado, anunciou o glorioso regresso da indústria americana com a mesma solenidade de um alquimista que jura transformar latão em ouro.
A sua poção são as tarifas, essa panaceia milagrosa com a profundidade teórica de um tweet e a eficácia comprovada de um remédio homeopático para amputações.
Trump antevê uma utopia de fábricas ressuscitadas e chaminés novamente a fumegar, produzindo lixo a preços de luxo, com operários felizes e reluzentes, a caminho dos empregos certos de há 60 anos, embora tudo isto seja tão provável como encontrar a Mariana Mortágua daqui a um mês como primeira-ministra.
E para tamanho milagre, para ver Detroit a desabrochar numa nova era industrial, só é preciso taxar tudo o que vem de fora, desde aço alemão a cuecas vietnamitas. Esqueça-se para já a produtividade, a inovação ou a competitividade: o futuro é um revivalismo dos anos 50,
É uma lógica encantadora, quase poética, se não fosse tão economicamente analfabeta. Como se pintar a parede impedisse a casa de desabar.
A ironia filosófica aqui é brutal: ao tentar proteger a economia da competição global, Trump acelera o seu colapso interno. Quer fabricar estabilidade com a mesma ferramenta com que se fabrica ressentimento: a nostalgia.........
© Observador
