Um livro, uma obsessão e um síndrome
Escrever Johnny Man, Lisboa/Porto – Luanda – Londres, 1970-1975 e tudo o que se lhe sucedeu, deixou-me aluado, atarantado, desatento e inseguro, levando a faltas a compromisos, e outras omissões, desregramentos, etc. Foi desde Novembro até agora, resultado de uma recusa obstinada do que aparenta ter sido um êxito. Foi o Síndrome do Impostor, uma designação clínica.
Estas linhas são produto da necessidade de reflexão pausada sobre tal padecimento, não havendo nelas qualquer narcisismo, presunção ou pretensão. Foi uma terapia, apenas. Mas que resultou em cheio: fiquei curado, como se poderá ver. E, segundo me disse um médico altamente qualificado, estas notas podem interessar e ser úteis para muitas pessoas que sofrem da recusa ao reconhecimento de algum êxito nas suas tarefas. Seria capaz de publicar, como ele sugeriu?
O primeiro lançamento do livro foi no passado dia 17 de Outubro, com a assistência de 480 pessoas que preencheram os Auditórios 2 e 3 na Fundação Gulbenkian. A abertura da sessão pertenceu ao Presidente da Fundação, António Feijó, a que se seguiu uma introdução (por vídeo) do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. A apresentação ficou a cargo de Jorge Braga de Macedo e José Manuel Fernandes, moderados por Helena Matos. Pode ser visto ou recordado aqui. Foi uma ocasião que me impactou.
Oito dias depois aconteceu a apresentação no Porto (o vídeo, infelizmente, ficou defeituoso), também concorrida, na Fundação Eng. António de Almeida. A introdução foi feita pelo seu Presidente, Augusto Aguiar Branco, e a apresentação do livro por Luís Valente de Oliveira e Carlos Costa, tendo sido exibida novamente a análise por vídeo de Marcelo Rebelo de Sousa. A primeira edição do Johnny Man esgotou, e a segunda está, neste momento, a aparecer nas livrarias.
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Mas o que foi essa recusa, esse aluamento, essa ressaca? Seria mesmo pós-embriaguês? Porquê? Pensei: PDI? Ou “teria sido demais para a minha camionette”, um dito talvez já em desuso…
Veredicto: Foi o livro. E o síndrome da recusa foi o desaguar de uma obsessão compulsiva que vivi durante mais de ano e meio. Tratou-se de um mono-assunto diário do meu íntimo, de conversa em casa (o meu entorno directo ficou saturado) e entre amigos. Foi o livro.
A elaboração do texto tinha sido particularmente difícil, sobretudo por ter revisitado um período da história de Angola que vivi na pele (parte 2 de Johnny Man), muito punitivo e controverso, que eu julgava definitivamente arrumado. Aborda o tempo decorrido a partir de Julho de 1974 que se prolongou por 1975, e originou uma hecatombe pouco estudada, que se traduziu, no curto espaço de cerca de um ano, no êxodo maciço de mais de um milhão de pessoas, em que me incluí, e o abandono, no ano da independência, de um património empresarial que, fazendo a extrapolação dos valores em escudos de 1975 para euros de 2019, seria equivalente a 450 mil milhões de euros, o dobro do PIB português nesse mesmo ano. A escrita da parte 1 do livro, com múltiplas consultas para me certificar da verdade dos factos, foi........
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