No dia em que um Chega disto liderar um governo
Nas últimas legislativas, a Aliança Democrática de Luís Montenegro venceu — mas sem maioria. O verdadeiro abalo sísmico? O Chega tornou-se a segunda força política nacional. Não foi acidente. Foi consequência. De anos de promessas quebradas, impostos sufocantes, serviços públicos em queda e uma classe média exausta de sustentar o sistema enquanto vê a ineficiência, a subsidiação sem critério e a corrupção, desfilarem à sua frente.
Mas há um outro dado, mais profundo: Portugal habituou-se, durante os últimos 50 anos, a ser governado numa espécie de anarquia suave — um país gerido com mais retórica do que estratégia, mais compadrio do que planeamento, mais improviso do que visão. E agora, quando surge alguém a desafiar essa ordem caótica, muitos não conseguem aceitar a possibilidade de uma nova realidade. Porque a mudança parece que assusta mais do que o mau hábito. E quem sempre votou nos mesmos continua preso à ilusão de estabilidade — sem ver que o país já mudou por baixo dos seus pés.
Populista. E então e depois, não servirá para ganhar?
Ventura é chamado populista com frequência — e quase sempre com desprezo. Mas o populismo não é, necessariamente, por si só, um mal declarado à nascença. É, acima de tudo, um estilo. E como todo o estilo, pode ser eficaz — ou perigoso. Pode libertar… ou pode mesmo manipular. É o discurso que coloca o “povo” contra as “elites”. Que simplifica. Que dramatiza. Que promete rupturas. E que cresce quando os partidos do sistema deixam de ouvir e responder. A questão real, que quase ninguém quer enfrentar, é esta: e........
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