Projectos de reforma eleitoral: mudar para pior?
Este artigo pretende analisar alguns problemas do sistema eleitoral da Assembleia da República (AR), bem como a tentativa dos projectos de reforma eleitoral do BE, IL, Livre e PAN de os corrigir. Termina com uma reflexão sobre a reforma do sistema eleitoral, e uma proposta alternativa.
O sistema eleitoral da Assembleia da República (AR) deve ter dois objectivos. Em primeiro lugar, deve ser proporcional, ou seja, deve assegurar que uma determinada percentagem de votos do eleitorado se converte na mesma percentagem de lugares na AR. Um partido com 10% dos votos deve ter 10% dos deputados. Em segundo lugar, deve permitir alguma ligação entre eleitores e eleitos, para efeitos de identificação e responsabilização. A representação geográfica, ou eleição de candidatos em listas regionais, é uma forma de conseguir essa ligação. Quanto mais pequena a lista, especialmente se for uninominal, maior a identificação entre eleitor e candidato, e o inverso é verdadeiro.
A proporcionalidade é uma consequência do princípio de igualdade, expresso na frase «um homem, um voto». Para que se cumpra o princípio, o voto de cada eleitor deve ter a mesma probabilidade de impactar o resultado final, como refere a jurisprudência do prestigiado tribunal constitucional alemão, desde 1952. A proporcionalidade requer duas condições:
Por um lado, a proporcionalidade requer círculos com muitos deputados, para representar fielmente as escolhas do eleitorado. Por outro, a ligação entre eleitos e eleitores aconselha círculos pequenos. Para complicar, existem zonas do território nacional densamente povoadas – que originam círculos geograficamente pequenos, com muitos deputados – e outras esparsamente povoadas – causando círculos geograficamente grandes com poucos deputados. O Gráfico 1 revela que, de entre os 20 círculos do território nacional, 11 têm menos de 9 deputados, ou seja 55% do total e 2 milhões de eleitores, todos no interior. Sendo que, nos últimos anos, o n.º de partidos com assento parlamentar ronda os 9, estes 2 milhões eleitores não tem o mesmo “poder de voto” dos seus compatriotas do litoral. É este o fenómeno dos “votos desperdiçados”.
Um sistema proporcional deve compensar estes defeitos, permitindo que os eleitores em qualquer ponto do território nacional possam escolher sem o constrangimento do número de mandatos disponíveis. Um eleitor lisboeta de um pequeno partido sabe que, num círculo com 48 lugares, o voto tem uma elevada probabilidade de representação........
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