Teatro dos Acordos
Num domingo de primavera que prometia tudo menos versos suaves, Portugal decidiu brindar-se a uma sinfonia de contradições: 32,7 % dos votos para a Aliança Democrática, 89 lugares no parlamento e um sorriso cristalino de vitória… sem maioria. Luís Montenegro ergueu o troféu, mas ergueu-o acima de um palco rasgado, rodeado por 141 cadeiras vazias. É o triunfo contraditório de quem ganha, mas na verdade perde — perde a margem de manobra, a confiança incondicional, a ilusão de um mandato inconteste.
O Partido Socialista, coadjuvante infeliz desta tragédia cómica, sorveu o amargo néctar da humilhação ao empatar com o Chega: 58 deputados cada. Quem diria que, um dia, PS e extrema‑direita dariam as mãos na prodigiosa arte da irrelevância? Pedro Nuno Santos, contando com o ovo na galinha, julgava que poderia continuar a ser o “boy do sistema” e viver indefinidamente da herança política de António Costa. Pois bem: o ovo quebrou‑se antes da eclosão, e o rapaz perdeu o ninho. A demissão tardia foi um derradeiro mea culpa, mas deixou o PS refém de uma identidade........
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