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Treze dias na América (os últimos oito)

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04.05.2025

À noitinha, no regresso ao hotel, um homem de “t-shirt” vermelha parou a bicicleta velha para perguntar que língua era a minha e a das pessoas que me acompanhavam. “Português”, informei, o que serviu para o homem explicar, no sotaque “gullah”, o crioulo da região, a odisseia dos N’gola, grosso modo os habitantes do que se tornou o norte de Angola e que, capturados pelos portugueses, acabariam, muitos deles, por entrar através de Charleston na rota da escravatura da colónia inglesa que hoje é a América. Fiquei entusiasmado à espera de uma longa prelecção sobre “interseccionalidade”, Teoria Crítica, “reparações” e opressão em geral. Em vez disso, fiquei decepcionado ao ouvir um negro pobre desatar a criticar os seus semelhantes, os que no “hip-hop” e no dia a dia banalizam a palavra “nigger” sem noção de que estão a banalizar a própria subjugação, os que abandonam as famílias, os que assumem o estatuto de vítimas como uma identidade. Acho indecente que um negro sem instrução não aceite e perpetue o estereótipo de “revoltado” que intelectuais brancos lhe impõem. Para o final da conversa, perguntei-lhe o que é que ele sentia ser. “Sou um americano”. Um vendido e um racista, portanto. Merece a bicicleta velha.

A fim de tomar o pequeno-almoço num dos cafés da zona, estacionei em Chippewa Square, lugar de filmagens das cenas de ligação em que, sentado no banco, Forrest Gump conta a sua história. A sua história é a de um sujeito intelectual e academicamente........

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